Eu sei que quase não atualizo aqui e que deveria aproveitar o raro tempo livre que encontro para falar de algo relevante, mas é que hoje eu definitivamente tive uma prova de que os deuses dos livros estão mandando uma mensagem para mim. A mensagem: LEIA STONER.
Ok, do começo, sinal número um. Estava lá na Amazon no meu velho esqueminha de “Customers Who Bought This Item Also Bought” buscando algo meio parecido com Dept. of Speculation porque (como visto no episódio anterior) eu adorei o livro. Eis que entre as ‘n’ opções (algumas que eu já tinha lido, outras que já estão no kindle mas não estou bem no momento certo para ler) aparece um tal de Stoner, de John Williams.
Começo dizendo que é só uma fase, que um dia eu volto ao normal e escrevo posts longos e detalhados sobre cada livro que estou lendo. Mas entenda: há um ser humano novo em folha aqui em casa que depende quase que totalmente da minha atenção (e dos meus peitos). Tenho lembrado muito de uns trechos de Tipos de perturbação da Lydia Davis, especialmente este:
Você se acostuma a não terminar nada. Por exemplo, o bebê está olhando fixo para uma bola vermelha. Você está na pia lavando uns rabanetes bem grandes. O bebê começa a se agitar quando você acabou de lavar quatro e ainda faltam oito.
O que significa que comecei este post já achando que não vou terminá-lo. Ou que escreverei aos poucos, em pedacinhos. Essa coisa de escrever aos poucos lembra uma história que contam sobre a carta que o Wilde escreveu para o Bosie enquanto estava na cadeia (sim, a que virou o De Profundis), que ele recebia uma quantidade limitada de papel e que tudo que ele escrevia era recolhido no fim do dia, mas mesmo assim ele conseguia manter a coesão do texto, começando um novo trecho da carta no papel novo exatamente onde tinha parado no dia anterior. Moral da história: não sou Oscar Wilde, então espera um post meio sem sentido.
Quase três semanas sem atualizar, acabou que até o aniversário de 11 anos do Hellfire passou batido e eu acabei de clicar em “Justificar” e pensei como seria legal se ao clicar nesse botão aparecesse uma justificativa automática, mas divago. O fato é que desde que o Hellfire é Hellfire eu sempre tive problemas para escrever enquanto minha cabeça estava em outro lugar. No momento só penso no Augusto, nos últimos detalhes que faltam para a chegada dele. Então sento aqui, penso em como preciso dizer que O Grande Hotel Budapeste é lindo, falar mais um pouco sobre Penny Dreadful ou sobre os livros que estou lendo e bem, como deve ter dado para reparar, o rascunho vai para a lixeira ou nem existe. Mããããs…
… eu preciso deixar anotado aqui uma coisa ou outra sobre os livros. Aquela história que vivo dizendo: não confio muito na minha memória. Tenho uma tendência horrível de achar tudo muito melhor ou muito pior do que realmente achei depois de um tempo. Com o registro, pelo menos a opinião de quando li algo não se perde. Acho. Então é isso, atualizando agora com umas rapidinhas sobre as leituras da metade de junho para cá.
(Se você pensar bem, parei de atualizar tão logo começou a Copa. Será que estou usando Augusto de desculpa para minha sem-vergonhice? Pior que nem tem como saber: é provável que o guri chegue bem na final)
Um novo livro, Marcus, é uma nova vida que começa. É também um momento de grande altruísmo: você oferece, a quem estiver disposto a conhecer, uma parte sua. Alguns vão adorar, outros, detestar. Alguns vão tratá-lo como celebridade, outros, desprezá-lo. Alguns sentirão inveja, outros, terão interesse. Não é para eles que você escreve, Marcus. E sim para todos aqueles que, graças a Marcus Goldman, terão tido um bom momento em seu dia a dia. Você me dirá que isso não é nada de mais e, não obstante, já é muito. Alguns escritores querem mudar o mundo. Mas quem realmente pode mudar o mundo?
A citação acima, um dos vários ensinamentos do professor Quebert para o jovem Marcus Goldman, aparece em um momento já avançado do romance A Verdade Sobre o Caso Harry Quebert (que saiu recentemente aqui no Brasil pela Intrínseca). Na hora que bati os olhos nessa fala imediatamente pensei na recepção que esse livro vem tendo desde que foi lançado. Como previsto por Quebert, tem quem adore e tem quem odeie. E como em quase todos os casos de livros que despertam opiniões tão contrárias, acho que pelo menos no caso do ódio o romance de estreia de Dicker foi meio que vítima do hype.
Olha, é óbvio que um autor publicado deseja que sua obra seja lida pelo maior número de pessoas. O problema é que quanto maior o número de pessoas “lendo para saber o motivo de tanta gente estar falando desse livro”, parece que a expectativa sobre o conteúdo da obra aumenta. Como se existisse uma relação direta entre qualidade e pessoas falando do livro, ou números de exemplares vendidos (o fato de noticiarem que A Verdade Sobre o Caso Harry Quebert desbancou Cinquenta Tons de Cinza do topo das listas de mais vendidos parece já falar bem alto sobre como não existe esse tipo de relação, certo?). Resultado: muita gente lendo o livro como se Dicker fosse o próximo nome a ser cogitado para o Nobel, quando na realidade aquela citação que abre o post já indica muito bem qual o caminho que ele quer tomar ao escrever esta ficção: te oferecer um momento de distração no seu dia. Só.
Já devo ter comentado por aqui de como quando estou sem ideia sobre o que ler uso aquele “users who bought this also bought this” na Amazon1 de livros que gostei para ver se acho outra coisa bacaninha, certo? Bem, um título que aparecia bastante era o This Is Where I Leave You, do Jonathan Tropper. Publicado lá fora em 2009, e chegando no Brasil pela Arqueiro como Sete dias sem fim no ano passado, pela sinopse ele parecia ter um jeitão meio “nickhornbyesco“, digamos assim. E eu ia lá enrolandinho e deixando para ler outra hora, até que vi o trailer da adaptação que está para sair em setembro deste ano, e sabe aqueles filmes que só pelo elenco você já assistiria? Pois é. Então porque eu não gosto de ler o livro depois de ver o filme, acabei jogando para o começo da fila.
Negócio é: Sete dias sem fim é o equivalente literário de comédia com famílias disfuncionais que vemos no cinema ou na TV. Enquanto o narrador (Judd Foxman) ia descrevendo os irmãos, a relação com os pais e afins, pensei em um punhado de histórias similares. Pega um bocadinho de Six Feet Under, mistura com uma pitadinha de Os excêntricos Tenenbaums, um tantico de Os Simpsons e por que não um punhado de Pequena Miss Sunshine? Mais ou menos assim. Então sim, você terá aquela sensação de já ter “visto esse filme”, mas veja bem: eu acho que o tanto de histórias já contadas sobre famílias assim só é grande porque se for ver bem, famílias-modelo são a exceção, não o contrário. Então é um tema tão comum que talvez a familiaridade que você venha a sentir com algumas personagens seja grande não por causa de filmes, mas por causa de pessoas reais que você conheça (lá em casa tínhamos uma piada sobre uma família perfeita que chamávamos de “Os Flanders”, sempre nos referíamos a eles desse jeito. Obviamente nos víamos como “Os Simpsons”).
Quando fui pesquisar sobre Condenada de Chuck Palahniuk (livro que saiu pela Leya aqui no Brasil no ano passado), fiquei um tanto surpresa ao descobrir que ele tinha começado a escrever a história como uma forma de lidar com a morte da mãe. Ok, ele repete incontáveis vezes a ideia de que morrer todos nós vamos mesmo (não importa quantas horas passe na academia, se abre mão do açúcar e só coma orgânicos), e isso me parece até algo saudável para se agarrar no momento da morte de um ente querido. Por outro lado, como é que ele conseguiu manter tamanho senso de humor com algo tão triste?
Porque dos três livros do Palahniuk que li até o momento (O Clube da Luta, Assombro e agora Condenada), esse foi de longe o mais engraçado. Insano os três são, cada um de um jeito completamente diferente. Mas engraçado ao ponto de você estar rindo com alguma passagem para lá de absurda envolvendo uma noção bem errada da palavra “malho”? Definitivamente não.
Ok, está aí um livro estranho. Eu já devo ter falado por aqui mais de uma vez de protagonistas tão chatos que acaba que eu simplesmente não me importo com o desenrolar da história, certo? Mas não consigo lembrar (pelo menos não agora às 8 da manhã, há!) de alguma vez ter odiado TANTO um protagonista e mesmo assim ter gostado TANTO de um livro. Vontade de vê-lo se ferrando no fim? Masoquismo? Não sei. Só sei que The Love Affairs of Nathaniel P., livro de estreia de Adelle Waldman, foi realmente uma experiência interessante.
Como já deve ter dado para imaginar, o protagonista detestável em questão é o tal do Nathaniel P., que daqui para frente chamarei de Nate porque é como o narrador se refere a ele. Enfim, Nate é um carinha que vive de escrever artigos para periódicos como freelancer, até que finalmente consegue um contrato com uma editora para lançar um livro. É a glória, no mundinho intelectual de Nova York retratado por Waldman – é mais do que um cartão de visitas, é o que te torna alguém. Ao ponto de você usar seus contratos como escala para se comparar com alguém: “Greer had sold her book for more money than he’d sold his, and would probably sell more copies, but as a memoirist of adolescent promiscuity, she lacked a certain… respectability.“. Enfim, acho que dá para entender o efeito que esse contrato tem: o carinha que era o zé-ninguém de repente entra na mira da mulherada.
(Dicona: post para quem já leu o livro ou não liga muito sobre essa coisa de “experiência de leitura”, porque ao falar sobre “experiência de leitura” e sobre o livro em si, eu provavelmente estragarei as coisas para você, veja só que contraditório.)
Assim que a discussão sobre spoilers retornou com força por causa do tal do purple wedding do Game of Thrones (que eu não assisto, não leio e não dou a mínima, vale ressaltar) eu imediatamente lembrei de O Sexto Sentido. Lembrei de ter ido ao cinema com minha mãe e irmã sabendo pouco mais do que “É um filme com fantasmas”, o tipo de coisa que é quase impossível em tempos de redes sociais, blogs, fóruns de discussões e afins. X-Men estreia oficialmente esta semana e eu já sei que terá uma cena foda envolvendo o Mercúrio. O segundo dos Vingadores nem chegou mas já vi fotos da Feiticeira Escarlate. É toda uma cultura de divulgação que se sustenta em adiantar para o público o que ele deverá ver e como deverá se sentir.
Pois bem, O Sexto Sentido. Só fantasmas. Vou dizer que minha principal surpresa não foi nem o plot twist, foi pensar que aquele cara maluco de cueca no começo do filme era o Donnie dos New Kids, hehe. Mas ok, aí você tem o plot twist, e então você volta para o cinema para tentar ver o que deixou passar para não ter previsto a virada, e nossa, que filme legal e engenhoso, como tudo se encaixa direitinho, vou indicar para um amigo, e ele indicará para outro amigo e pans, sucesso. A impressão que tenho é que se eu tivesse assistido a uma propaganda dizendo “VOCÊ TERÁ UMA SURPRESA NO FIM QUE FARÁ COM QUE VOCÊ QUEIRA ASSISTIR AO FILME NOVAMENTE”, eu provavelmente assistiria ao filme já procurando pistas para a tal da surpresa, o que estragaria a experiência. Mais talvez até do que saber qual é o grande-evento-que-não-deve-ser-mencionado.
Uma das lembranças que tenho de verão em família (pelo menos um dos últimos verões que passei com toda a família) era de nós, em um camping em Pontal do Sul, fazendo turnos para ler em voz alta algumas crônicas do livro Comédias da Vida Privada, do Luis Fernando Verissimo. Claro, a coletânea fazia um relativo sucesso na época por conta da adaptação para a tv, mas não era só isso. Havia algo nas histórias de Verissimo que encantavam não só porque nos enxergávamos ali, mas porque conseguíamos rir de nós mesmos através daqueles pequenos recortes do cotidiano.
Pensei bastante nesse livro enquanto lia Nu, de botas de Antonio Prata. Sei que em uma primeira observação, parece que só encontramos de semelhança entre um e outro o fato de ser uma coleção de crônicas cujo tom predominante é o humor. Mas não acredito que seja só isso. Tal como Verissimo, Prata parece ser um daqueles casos de pessoas que conseguem transformar experiências extremamente pessoais em algo universal. Não acho que isso seja característica de qualquer cronista – alguns conseguem agradar com seus textos, mas vem lá com o carimbo do tempo: passou uma semana, ele já causará um outro efeito no leitor. Mas no caso desses dois cronistas consigo imaginar gerações e gerações de famílias em campings lendo histórias e dando risadas.
Você sabe como funciona: você está lá de boa com seus livros, aos poucos riscando títulos da lista de leituras pendentes, quando DO NADA começam a falar de um livro em especial. Sites que você costuma ler apontam a obra como melhor do ano, prêmio aqui, prêmio acolá e pronto, curiosidade lá no alto, e algo que deveria ir para o fim da fila como todos os livros novos que as pessoas sugerem para você, sobe lá para o topo, vira prioridade.
Foi o que aconteceu comigo e com The Goldfinch de Donna Tartt, o queridinho do ano passado que agora em 2014 chegou a ganhar um Pulitzer. Ok, confesso (com vergonha): não sem antes uma certa dose de preguiça para encarar as quase 800 páginas do catatau em questão. Vou comentar sobre a questão do tamanho mais além, por enquanto fiquemos assim: terminei o livro no sábado e ainda não consegui organizar bem minhas ideias sobre ele, o que significa que escreverei caoticamente (as usual) e que o post poderá conter spoilers, mas embora eu ache frescura essa coisa de spoiler, ainda assim sou uma ~~cidadã de bem~~ e aviso antes, então né, ufa, a barra tá limpa. Ei? Que foi? Desculpa, não quis te chamar de fresco. Vem cá, me dá um abraço. Pronto, pronto, passou.