Desgracida (Dalton Trevisan)

Lembro de uma certa discussão na qual um rapaz de São Paulo questionava “Por que vocês curitibanos se acham donos de Dalton Trevisan?”. Na época até pensei em responder qualquer coisa sobre familiaridade, mas acho que hoje em dia eu entendo a revolta do leitor. Dalton transforma Curitiba no mundo (como Rosa fazia com o sertão? Não sei.), porque embora em certos momentos o curitibano tenha a nítida sensação de estar andando com as personagens por ruas que conhece tão bem, se você tira esse reconhecimento do espaço, o que fica é o humano – retratado às vezes com uma simplicidade que não tem como não visualizar o mini-conto como um episódio da vida do leitor, ou de um conhecido do leitor.

Desgracida, coletânea de contos lançada em julho pela Editora Record, deixa isso ainda mais evidente. Sim, você ainda pode sair em busca de Curitiba Perdida, mas repare como os contos poderiam estar em qualquer lugar. E são deliciosos, talvez até pela concisão: rápidos e rasteiros, você lê o livro em uma hora e fica querendo mais. Até porque está tudo ali, mais uma vez – a acidez, o humor, a delicadeza. Plural de pequenos eventos, um melhor que o outro.

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Catatau (Paulo Leminski)

Ganhei o livro há quatro anos e confesso que sempre começava mas depois largava no meio. Minha teoria era de que Catatau deveria ser lido em um fôlego só. Quando percebi que jamais conseguiria ler dessa maneira, larguei mão e resolvi ler aos poucos, como pessoas normais fazem com os livros, sabe? De qualquer forma continuo achando que a experiência teria sido milhares de vezes mais legal se eu pudesse ler assim, e mais: ler em voz alta.

Catatau é isso, uma experiência. Um “romance ideia”. É uma leitura diferente, com uma intenção diferente partindo do autor. Nas palavras do próprio Leminski: “O Catatau é o fracasso da lógica cartesiana branca no calor, o fracasso do leitor em entendê-lo, emblema do fracasso do projeto batavo, branco, no trópico.”1

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  1. LEMINSKI, Paulo. Catatau Curitiba: Travessa dos Editores, 2004. p.271 

Paulo Leminski

“ Faço uma proposta, frase feito por via de uma dúvida: alguém pensou aqui e não fui eu. O mundo não quer que eu me distraia. Distraído, estou salvo. Essa necessidade não é só física, é a necessidade da verdade, a carência de informações, a pobreza de dados. Não é agradável ser olhado por nós, saí da geografia por meio da história.”

Paulo Leminski

Bairrismo? Provalvemente não. Mesmo que Paulo Leminski não fosse curitibano tenho certeza que admiraria seu trabalho com a mesma paixão.É inovador até mesmo para os dias de hoje, e em alguns casos tão bem… “confeccionado”, que não tem como não reconhecer o mínimo de valor literário. Continue lendo “Paulo Leminski”