Ficção de Polpa da Não Editora chega justamente para desmentir essa ideia. Ao convidar vários escritores para formar a coletânea, a proposta segundo (Samir Machado de Machado na introdução) era esta: criar um conto de ficção científica, fantasia ou horror com completa liberdade temática. E os autores souberam aproveitar essa liberdade sem usar o conto como “meio” para apresentar brasilidades, eles fazem ficção brasileira, e de qualidade – sem a artificialidade de elementos inclusos única e exclusivamente para dizer que bem, é ficção feita no Brasil. Continue lendo “Ficção de Polpa Vol.1 (Vários)”
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Um erro emocional (Cristovão Tezza)
Cometi um erro emocional, Beatriz se imaginou contando à amiga dois dias depois — foi o que ele disse assim que abri a porta, o tom de voz neutro, alguém que parecia falar de uma avaliação da Bolsa, avançando sem me olhar como se já conhecesse o apartamento, dando dois, três, quatro passos até a pequena mesa adiante em que esbarrou por acaso, depositando ali o vinho com a mão direita e a pasta de textos com a esquerda (e ela se viu desarmada no meio de três sinais contraditórios, o erro, o vinho, o texto, mais a espécie de invasão de alguém que está à vontade — o que ela havia sonha-do, Beatriz teria de confessar à amiga, e ambas achariam graça da ideia — à vontade, mas não do modo correto) e Beatriz fechou a porta devagar com um sorriso de quem se vê imersa na ironia, e isso é bom; e se virou para escutar o resto, agora vendo-o com as mãos livres, a silhueta contra a luz, os braços brevemente desamparados daquele homem magro:
— Eu me apaixonei por você.
Desgracida (Dalton Trevisan)
Desgracida, coletânea de contos lançada em julho pela Editora Record, deixa isso ainda mais evidente. Sim, você ainda pode sair em busca de Curitiba Perdida, mas repare como os contos poderiam estar em qualquer lugar. E são deliciosos, talvez até pela concisão: rápidos e rasteiros, você lê o livro em uma hora e fica querendo mais. Até porque está tudo ali, mais uma vez – a acidez, o humor, a delicadeza. Plural de pequenos eventos, um melhor que o outro.
Macunaíma (Mário de Andrade)
E então que eu resolvi dar uma segunda chance e pedi de presente de aniversário. Ganhei da Day, que deu para mim outros ótimos livros, incluindo uma versão em inglês de Ensaio sobre a cegueira que ainda tenho que ler. Enfim, que surpresa ahn. Adorei Macunaíma. Devorei o livro nas horas que tinha livre e depois ainda fiquei pensando nele, saboreando alguns momentos e pensando em como deveria ter sido legal conversar com o Mário de Andrade, há.
O Seminarista (Rubem Fonseca)
Somando isso a uma campanha de marketing muito bacana que inclui até um video com ninguém mais ninguém menos do que o próprio Fonseca narrando o começo do livro, fica difícil segurar a curiosidade e esperar para conferir o que o autor de obras como Lúcia McCartney (1967), O caso Morel (1973) e Agosto (1990) trouxe de novo para os leitores.
Areia nos Dentes (Antônio Xerxenesky)
A narrativa mostra um sujeito tentando recuperar a história da família ao escrever um livro sobre os tempos em que viviam em um povoado no sul dos Estados Unidos. Aos poucos o narrador vai interrompendo a narrativa, seja por um problema com o computador, seja por embriaguez. E quando você já está afoito pensando: cadê os zumbis, cadê, cadêêê?, Já era. Xerxenesky já prendeu sua atenção e você quer saber dos dois Juans. Você já consegue sentir o calor e a poeira da Mavrak, cidade dos antepassados do narrador.
Catatau (Paulo Leminski)
Catatau é isso, uma experiência. Um “romance ideia”. É uma leitura diferente, com uma intenção diferente partindo do autor. Nas palavras do próprio Leminski: “O Catatau é o fracasso da lógica cartesiana branca no calor, o fracasso do leitor em entendê-lo, emblema do fracasso do projeto batavo, branco, no trópico.”1
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LEMINSKI, Paulo. Catatau Curitiba: Travessa dos Editores, 2004. p.271 ↩
Quem é Capitu?
Não que eu tenha uma adoração tremenda pela personagem. Admiro sim, é a capacidade do Machado de ter incluído em nosso imaginário essa figura que é, por si só, uma interrogação. E acredito que justamente por isso que Quem é Capitu?, recém-lançado pela editora Nova Fronteira, é tão especial: ao invés de focar no mistério básico da traição ou não, ele vai além e mostra faces e faces não só de Capitolina, mas da obra Dom Casmurro em si.
Convite para quem estiver em Curitiba
Por que os livros são caros no Brasil?
A pergunta no Hotel Terra na verdade serve para abrir espaço para citar um blog de economia estrangeiro, que fez a mesma questão sobre os preços elevados dos livros por aqui. O Marginal Revolution tenta responder com quatro argumentos, embora para falar bem a verdade o primeiro já mata a charada: a maioria dos brasileiros não lê.