Melhores leituras de 2020

É estranho. Passei quase todo o ano passado falando que a pandemia tinha esculhambado minhas leituras, afetado o ritmo, etc e aí fechou o ano, fui ver as contagens lá do Goodreads e meio que bateu com minha média de sempre. Mas eu sei que afetou algumas escolhas de leitura (tendi para leituras mais leves, por exemplo), e tenho total noção que afetou a experiência de leitura também. Tenho certeza que já coloquei esse link do texto do Julián Fuks em vários lugares, mas vou citá-lo mais uma vez porque descreve exatamente meu sentimento enquanto leitora:

(…) me sinto menos capaz de me entregar por completo à leitura, de deixar que ela tome a minha mente inteira. O momento que vivemos é estridente demais, a cada instante convoca os meus pensamentos. Sinto falta, então, de uma literatura plena – e sinto falta de um passado e de um futuro que se deixem ler sem a lente do presente.

No fim das contas não é tanto sobre a quantidade de páginas ou de livros lidos, é mais como estava minha cabeça quando foram lidos. E por causa disso, fica aquela promessa de revisitar em outro momento alguns títulos, mesmo os que não apareceram entre os dez favoritos. E é isso. Então toca o play para a trilha sonora do post e vamos para a lista de 2020, que ficou assim (lembrando, títulos com link é porque já falei do livro aqui):

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Os melhores filmes de 2020

Mais de uma vez em 2020 eu pensei: “Putz, que saudades de ir ao cinema.”. E tenho saudades mesmo. Mas dia desses me dei conta que não é mais um dos problemas gerados pelo covid: o cinema do qual sinto falta não existe há anos, pelo menos aqui em Curitiba.

Se você quer qualquer coisa fora do universo cinemático da Marvel (e sem reclamações, eu gosto dos filmes da Marvel, mas também gosto de outros filmes), já precisa se contentar com poucas salas e poucas opções de horário. Aí tem o problema do número de salas com áudio original. E quando as estrelas se alinham e você finalmente consegue uma sala no horário que poderia ir, com áudio original (e sem 3D), ainda tem que lidar com os malas que foram ao cinema para, sei lá, ficar olhando para a tela do celular. Enfim. Eu poderia botar essa na conta do covid, mas não vou.

Também não vou fazer o jogo do contente porque não tem lado bom para uma pandemia que nesse momento se aproxima da casa dos 200.000 mortos só aqui no Brasil. Mas observando as coisas como são (ou ainda, como foram), chamou minha atenção que o número menor de lançamentos nos cinemas acabou com um certo tipo de angústia de estar em dia, aquela coisa de “tenho que ver o que é essa coisa que tá todo mundo comentando”. É uma angústia besta, mas se você também deu uma respirada aliviada porque não teve que ver tooooodos os filmes, deve entender do que estou falando. E aí sobra mais tempo para outras coisas, para ver aqueles que há tempos queria, mas nunca tinha assistido – e alguns foram tão legais que dá até vontade de fazer uma lista fora das regras das listas aqui.

Revi Entrevista com o Vampiro, Da Magia a Sedução (melhor filme de bruxa) e Monty Python em Busca do Cálice Sagrado, finalmente vi Perfect Blue, A Época da Inocência, The Philadelphia Story, O Serviço de Entregas da Kiki (a coisa mais fofa e mais feel good que assisti nesse ano lazarento), Paris When it Sizzles, Dente Canino. Deu para ver uma penca de comédia romântica, incluindo uns com a Sandra Bullock do começo do século que eu acabei perdendo. Assisti dois Guy Ritchies no mesmo ano, caraca. Enfim, a última vez que vi tanto filme eu ainda não tinha filhos, não trabalhava e morava com minha mãe.

E dos mais recentes, não faltou coisa nova para ver, só faltou os mega-super-filmes-do-ano, que resolveram segurar para ver qual é. Eu ainda estou curiosíssima sobre Promising Young Woman e The Green Knight. O primeiro parece que saiu da gaveta lá fora (andou ganhando um monte de prêmios), o segundo continua engavetado, de repente em 2021 ele aparece. Nem que seja direto em serviços de streaming, como aconteceu agora no fim do ano com o Wonder Woman 1984.

Então é isso. Só para referência, ficam as listas dos outros anos: 2004| 2005| 2006| 2007| 2008| 2009| 2010| 2013| 2014| 2015| 2016| 2017| 2018| 2019| Fechando naquelas regras de sempre, lançamento nacional (streaming, cinemas, etc.) e qualquer outra chunchada aleatória para servir na lista, o top10 do ano na minha opinião ficou assim:

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Séries em 2020

Agora no fim do ano bateu uma preguiça e um cansaço de tudo, então acho que vou acabar fechando minhas listas de favoritos mais cedo. Por causa da pandemia eu achava que teríamos em 2020 um problema parecido com o da greve dos roteiristas – que pela impossibilidade de gravar novos episódios teríamos um monte de reprise e pouca coisa nova – mas não foi o caso.

Das que eu acompanhava deu para perceber um corte em número de episódios, e acho que só uma não teve temporada nova lançada (Younger, minha novelinha de mercado editorial favorita, mas assisti Romance is a Bonus Book e meio que deu para matar saudades?). Resumindo: Mais um ano que eu não dou conta de ver tudo o que sai por aí, há.

2020 foi também o ano em que acabaram duas das minhas séries favoritas, Bojack Horseman e The Good Place. O encerramento das duas foi perfeito, e de vez em quando eu me pego voltando para alguns episódios, algumas falas, alguns momentos. No meio de tanta coisa que a gente vê sabendo que passada a febre do lançamento provavelmente ninguém mais comentará, é bom saber que por uma série de fatores eu acabei apostando em coisas tão legais, que seguirão comigo.

Das que eu já acompanho, What We Do in the Shadows continua excelente. The Boys eu achei que deu uma ligeira caída, mas a personagem interpretada pela Aya Cash ( <3 ) rendeu os melhores momentos. Doom Patrol deu uma piorada grande, muito episódio eu acabei assistindo mais porque com a pandemia a temporada foi mais curta e então eu pensava “ok, falta pouco”. Não sei se volto para a terceira.

E chegamos então ao top5 das novidades de 2020. Eu acho que a maior parte dos títulos da lista são minisséries ou antologias, algumas não chegaram a ganhar o sinal verde para a segunda temporada ainda. Enfim, é uma lista esquisita para um ano esquisito. Fora de ordem, pense que se chegou aqui é porque gostei tudo igual.

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It is Wood, It is Stone (Gabriella Burnham)

Estava lendo mais uma daquelas listas de lançamentos, quando bati os olhos em uma capa linda (nem venha me julgar, olha ali pro lado e veja como é linda mesmo). Comecei a ler a descrição do livro, “as vidas de três mulheres se cruzam durante um ano em São Paulo“. A cidade brasileira obviamente chamou minha atenção, e pensei que era autora nacional que estava sendo traduzida lá fora, só que pesquisando descobri que a Burnham é filha de brasileira, mas nascida e criada nos Estados Unidos, e o livro foi escrito originalmente em inglês (e boa sorte para quem for traduzir por aqui, mas disso falo depois).

Fiquei imediatamente curiosa, até porque renderia no mínimo um olhar diferente sobre nosso país – alguém que apesar da ancestralidade, “não é daqui”. Lembrei muito de um artigo ótimo que li no Millions, Rivers and Mirrors: World-Building in Nonfiction. Escrito pelo jornalista Chris Feliciano Arnold (nascido no Brasil mas criado por norte-americanos no Oregon) o texto comenta a tentativa de falar de um país que é dele mas ao mesmo tempo não é, de como sua língua-mãe não dá conta de descrever o lugar onde ele nasceu: “Sad but true: There is only so much room in the English language for stories about non-English speaking countries.”

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Livros da quarentena

Diabo de ano esquisito. Eu vejo fotos de janeiro e fevereiro e não consigo nem imaginar o que era que eu tinha em mente sobre 2020, até o sentimento naqueles tempos já parecem meio alienígenas. O negócio é que estou perto de completar cinco meses de isolamento. Já passei por crises de ansiedade, já mandei uns “VOCÊS PAREM COM ESSAS BRINCADEIRAS ESTÚPIDAS PORQUE A GENTE NÃO PODE IR PRO HOSPITAL” para os piás, já estou naquele ciclo de ficar com raiva por mais um dia trancada em casa, e aí me sentir culpada porque afinal eu posso ficar mais um dia trancada em casa, etc. etc. etc.

Enfim, nada que não esteja acontecendo com quase todo mundo por aí. Eu digo quase porque dia desses umas gurias da vizinhança gritavam “a minha bandeira jamais será vermelha” da sacada, e eu pensava “puxa, queria viver nessa mesma realidade em que a preocupação principal não é um vírus que já matou mais de 100.000 brasileiros, mas a possibilidade de sermos tomados pelo fantasma do comunismo”.

Blé.

Enfim, a pandemia esculhambou minhas leituras também. Inicialmente porque eu simplesmente não conseguia me desligar da realidade para embarcar na história que lia. Aquela coisa de “Moça, não abraça o cara, cumprimenta de longe” ou “Nha, saudades aglomeração no bar”. Depois o problema com as leituras ficou um pouco diferente, é sobre concentração, mas não mais pelo conflito entre a realidade que estava vivendo e a ficção que estava lendo. É mais que tem tanto acontecendo que a cabeça está sempre em outro lugar, nunca no que estou lendo e então a leitura não flui como deveria.

Mas mesmo com todas as dificuldades, volta e meia lembro de algum livro que li em outros  tempos. E aí achei que seria legal elaborar uma lista, situando os títulos nos momentos do isolamento, o que de certa forma explicaria a lembrança. Para lembrar os velhos tempos, é um misto de relato com top5. Começando, é claro, pelo começo.

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Little Eyes (Samanta Schweblin)

Vou começar dizendo que tinha um post entre o último que publiquei e esse que escrevo agora. Era uma espécie de relato do isolamento que não consegui concluir, mas achei que ficaria esquisito chegar aqui e falar do livro novo da Schweblin que acabei de ler, como se hum, o mundo não estivesse de pernas para o ar (e aqui no Brasil o problema não é só sanitário). Então só para deixar registrado: o mundo está de pernas para o ar, mas a gente toca o barco como pode – no meu caso, ainda bem que ainda tenho meus livros para me distrair.

Sobre o livro: Little Eyes (Kentukis no original) da argentina Samanta Schweblin saiu em outubro de 2018 e recentemente ganhou uma tradução para o inglês – há uma tradução portuguesa, mas no Brasil pelo que eu vi ainda não tem nada. Os anglófonos estão bem encantados, tanto é que o livro está na longlist para o International Booker Prize de 2020, então o negócio é torcer para que isso sirva como incentivo para alguma editora daqui.

(EDITADO 06/08/2021: A Fósforo lançou o livro aqui no Brasil há pouco, o título é o mesmo do original, Kentukis. A tradução é de Livia Deorsola. Clique aqui para saber mais.)

A história descreve a vida das pessoas do mundo todo durante a mania dos kentukis – bichinhos de pelúcia controlados remotamente por uma pessoa desconhecida. Desde o início fica a impressão de que é  algo que poderia acontecer conosco agora mesmo – isso se não extrapolarmos e pensarmos que já acontece, de certa maneira, com nossos celulares ou assistentes tipo a Alexa. Mas o mais bacana é que a autora vai além da discussão sobre como abrimos mão de nossa privacidade, explorando também o horror do que somos quando ninguém está olhando – ou quando achamos que ninguém está olhando.

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High Fidelity (2020)

Agora em 2020 Alta Fidelidade de Nick Hornby completa 25 anos. Dos 25, pelo menos 16 eu passei comentando, citando, babando ovo para o livro aqui no Hellfire – então dá para entender que sim, eu sou exatamente o público da nova adaptação do romance que saiu em fevereiro desse ano no Hulu. Soma aí a curiosidade de ver como é que ficaria a série em uma versão mais moderna e com o tal do gender flip – Rob Fleming agora é Robyn “Rob” Brooks, interpretada por Zoë Kravitz.

Começando pela versão moderna – vale lembrar que quando o livro saiu, as pessoas ainda compravam cds. Não só pessoas apaixonadas por música, mas pessoas comuns. Não tinha internet para baixar trocentos mil álbuns de bandas de todos os cantos do mundo, a relação ainda era diferente. Eu nem vou me prolongar muito nisso porque sobre as diferenças o próprio Nick Hornby já comentou em um artigo que escreveu há cinco anos para a Billboard (recomendo demais a leitura).

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The Regrets (Amy Bonnaffons)

Se você ler a sinopse de The Regrets, primeiro romance de Amy Bonnaffons, não vai poder dizer em nenhum momento que não foi avisado sobre o fantástico ser uma constante na obra. Thomas morreu em um acidente de moto, mas por causa de uma confusão no passado, foi definido pelo escritório responsável por assuntos do pós-vida como “insuficiente morto”. Para colocar toda a situação em ordem novamente (já deu para perceber que o tal do limbo é um local bem burocrático, não?), o recém-falecido precisará passar mais três meses entre os vivos. É nesse período que ele conhece a bibliotecária Rachel. Contrariando as regras impostas a Thomas, os dois se apaixonam.

Parece quase uma comédia romântica imaginada por Tim Burton, não? Mas embora The Regrets seja muito engraçado em vários momentos, ele surpreende pelas escolhas da autora, e ao invés de ser uma fantasia sobre um casal improvável, é uma história que lida (entre outros tantos temas) sobre relacionamentos nos tempos atuais: das marcas que deixamos nas pessoas que passam em nossas vidas, da bagagem que carregamos para novos relacionamentos, da dificuldade de romper quando é preciso.

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Adoráveis Mulheres e o Oscar

Eu estava planejando um post bo-ni-to falando um pouco sobre os nove indicados para a categoria de melhor filme do Oscar (ontem finalmente terminei O Irlandês), mas hoje cedo li um artigo da Time sobre um possível motivo para a ausência de mulheres na lista de melhor direção e é isso, preciso me concentrar um pouco em Adoráveis Mulheres, porque o próprio filme fala sobre a situação da Greta Gerwig e outras diretoras em premiações como o Oscar e também de como são recebidas pelo público em geral.

Como já bastante comentado, Gerwig tomou algumas liberdades em sua adaptação. Eu não li o livro, não posso falar sobre as diferenças, então vou comentar aqui sobre minha visão entre a versão para o cinema de 1994 e a atual, sendo o ponto-chave a personagem Amy. Ao deixar de lado uma narrativa linear, Gerwig nos oferece uma visão diferente da irmã March: você pode até não morrer de amores pela personagem, mas há uma possibilidade de compreendê-la que não está presente na versão mais antiga.

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Such a Fun Age (Kiley Reid)

Emira Tucker é uma garota de 20 e tantos anos convencida de que perdeu o bonde para a fase adulta: todas suas amigas já estão trabalhando na área em que estudaram, algumas até comemorando promoção. E Emira, mesmo formada, não sabe muito bem o que quer fazer da vida. Por conta disso, paga as contas com trabalhos que não oferecem grandes vínculos (nem benefícios), entre eles babá de uma família de ricos, os Chamberlain.

Em uma noite especialmente ruim para Emira (comemorando o aniversário de uma amiga e percebendo justamente o quanto está ficando para trás), os Chamberlain pedem que ela venha correndo ajudá-los a distrair a filha mais velha enquanto lidam com uma janela quebrada. Emira leva a pequena Briar para um mercado da região e em determinado momento é abordada pelo segurança: uma cliente achou estranho uma menina tão pequena em um mercado naquela hora, e sugere que ela tenha sido sequestrada. Ah, sim, claro: Emira é negra, Briar é branca.

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