Eu não sei bem como foi que criei essa imagem, mas a impressão que tinha é que Lawanda, a faxineira do hospital, seria uma espécie de mistura de Amélie Poulain com Macabéa, e que o livro seria todo fofo, olha aquela borboleta na capa que não me deixa mentir. Bom, eis o choque de perceber que Lawanda não tem nada de fofa ou apática. Ela é tosquíssima e justamente por causa disso muito engraçada. Aliás, o tom do romance é esse: cômico. Um humor ácido e algumas vezes beirando ao nonsense (a começar pelo primeiro capítulo, com um julgamento da autora), do jeitinho que eu gosto.
Ela (Her, 2013)
Veja bem, eu tenho um fraco por histórias que buscam trabalhar um tema trivial (aqui, como nos relacionamos com o outro) de forma pouco convencional. Na história Theodore (Phoenix) é um homem que ganha a vida escrevendo cartas por outras pessoas que não são tão boas com as palavras quanto ele. Um dia ele fica sabendo sobre um novo sistema operacional criado para se adaptar ao dono e decide instalá-lo. Poucas perguntas depois, eis que surge Samantha (voz de Scarlett Johansson), que aparentemente não vai só se “adaptando” ao Theodore, mas evoluindo: ela tem senso de humor próprio e, o principal, sentimentos. O resultado disso é bizarro, mas óbvio para o enredo: os dois se apaixonam.
(Aviso: o post será uma série de aloprações minhas sobre variados momentos do filme, então assim, se você ainda não viu, pode ter spoilers, etc.)
Todos Nós Adorávamos Caubóis (Carol Bensimon)
Faíscas, se eu não me engano, é exatamente o primeiro capítulo de Todos Nós Adorávamos Caubóis, ou seja, a introdução para a história de Cora e Julia. Na época ficava claro um desentendimento no passado, provavelmente relacionado à viagem de uma delas, bem como o fato de que aquela viagem de carro pelo interior do Rio Grande do Sul surgia para Cora (narradora e protagonista) como uma oportunidade de reatar antigos laços. E no final das contas o romance durante os outros capítulos se desenvolve exatamente assim: a viagem de Cora e Julia, os estranhamentos sobre os tempos em que passaram distantes, as explosões de frases não-ditas presas na garganta, a intimidade compartilhada – tudo isso com um tempero de bons road movies norte-americanos.
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It’s Kind of a Funny Story (Ned Vizzini)
Mas aí temos casos como It’s Kind of a Funny Story de Ned Vizzini, e aí é simplesmente impossível escapar da relação vida e obra, até porque o próprio Vizzini passou alguns dias internado em uma ala psiquiátrica para tratar da depressão, tal como seu protagonista. Pior: no fim do ano passado o autor (então com 32 anos) se suicidou, deixando mulher e filho. “Um sujeito de sucesso, com pessoas que o amam e outras que dependem dele, como assim pode tirar a própria vida?”, alguns podem pensar. Outros já chegam com a resposta pronta “É coisa de covarde”. Falta talvez o exercício de empatia, de se colocar no lugar do outro para tentar compreender, o que a Literatura acaba ajudando a fazer. Assim, com It’s Kind of a Funny Story o efeito de vida do autor misturada com a obra foi bastante perturbador: ver a depressão com os olhos de quem sofreu desse mal chega a ser doloroso, especialmente se você tem conhecidos que fazem tratamento para tal.
Para organizar (Ou: listão de livros)
E aí que falei da preguiça de atualizar, mas a verdade é que estava ficando meio incomodada com a falta de comentários sobre o que li em dezembro e agora no começo de janeiro. Não, não é que eu ache que o mundo precise saber minha opinião sobre tudo o que eu leio, eu é que tenho o péssimo hábito de esquecer minhas impressões sobre determinado livro após alguns anos, e gosto de ter algo registrado para consultar. A solução número um seria partir para o giffy review, mas a verdade é que dá muito trabalho e nem sempre uma imagem basta. Então vamos para o listão mesmo, com alguns breves comentários. Começando com:
Os melhores filmes de 2013
A notícia boa é que ao contrário do que aconteceu em 2011 e 2012, agora em 2013 consegui ver até que uma quantidade razoável de lançamentos, o que justifica o top 10 como costumava fazer deeeeeeesde 2004. A notícia ruim é que o ano virou e eu não escrevi o post e ele está meio atrasadinho, mas ok, ok, antes tarde do que nunca. Lembrando que na lista valem apenas filmes lançados no Brasil em 2013 (falo mais sobre isso ali para frente). Só para deixar arrumadinho, links para os outros anos: 2004 | 2005 | 2006 | 2007 | 2008 | 2009 | 2010
Hum, sendo bem honesta aqui: primeiro lugar porque é combo com os outros dois, Antes do Amanhecer e Antes do Pôr-do-Sol. Minha primeira experiência com Jesse e Celine não foi das melhores, mas fazendo uma maratona para o Antes da Meia-Noite, me encantei de tal forma que foi uma das melhores experiências que tive no cinema este ano. Falei mais sobre os três neste post aqui.
Melhores (e piores) leituras de 2013
Então, sem mais enrolações, a listinha do ano. Clicando no link do título do livro você poderá ler minha resenha (trocentos anos escrevendo sobre livros e ainda não gosto de chamar post de blog de resenha, mas vá lá), por isso o comentário aqui no post é mais breve. Só ressaltando que a lista não conta só com livros lançados em 2013, por isso chamo de “melhores leituras” e não “melhores lançamentos”. E quando eu vi que ia dar uma roubada descarada com mini-listas, resolvi fazer um top 10 mesmo (só para explicar a quebra de ~~tradição~~, já que normalmente faço só top5). Vamos lá, para a lista:
MELHORES LEITURAS DE 2013
Eu sou da opinião que livro bom é livro que fica com você mesmo depois de muito tempo, e Haunted é exatamente o caso. Li em junho mas ainda não posso ver uma piscina e não lembrar da história do Saint Gut-Free e aí consequentemente de como esse livro mexeu comigo. E é isso: a galeria de personagens criada pelo Palahniuk acaba te assombrando, objetos ordinários fazem com que você lembre dos relatos extraordinários de cada um dos confinados. Mas mais do que os contos que mostram o que fez com que aquelas pessoas fossem ao “retiro de escritores”, o comportamento delas no tal retiro é bastante chocante também, e acaba trazendo bastante questões sobre a natureza humana. Saiu no Brasil como Assombro, pela Rocco.
A vida secreta de Walter Mitty
Você já deve ter passado os olhos em mais de um texto que aponta como o Facebook deixa as pessoas deprimidas. É aquela armadilha que armamos para nós mesmos: sabemos que o que aparece na timeline dos outros é “editado”, só os melhores momentos, e mesmo assim nos perguntamos por que não somos tão bonitos, felizes e bem sucedidos quanto aquelas pessoas que ali estão. E lembrando que não são só fatos da vida de uma pessoa que podem ser “editados”, como ela mesma pode criar uma personagem, expondo só o que tem de melhor (ou de pior, não vamos esquecer dos trollzinhos). Você também já deve ter lido qualquer texto daqueles que mesclam um tom de autoajuda com crítica, falando de como as pessoas têm 500 amigos em redes sociais mas poucos “na vida real”.
É essa linha cada vez mais tênue entre a vida virtual e a vida real que A vida secreta de Walter Mitty explorará, em uma metáfora até bem direta (e bastante óbvia), mas que nem por isso deixa de agradar. Mitty é um sujeito sonhador, que volta e meia está perdido em devaneios onde ele surge como um sujeito que faz tudo o que ele gostaria de fazer na realidade. O Mitty “dos sonhos” é corajoso, aventureiro, genial, extrovertido. Em suma, tudo o que Mitty “da realidade” acha que não é. Ele é o responsável pelos negativos na revista Life, que passa por um período de transição, com a edição de papel deixando de circular e passando apenas a contar com edição online. Há aqui mais um jogo entre ficção e realidade, já que a revista é real e de fato hoje em dia não conta mais com a edição impressa, por outro lado até algumas capas que aparecem no filme não são reais, incluindo aí, é claro, a capa com a foto do negativo 25, que some misteriosamente e é o que lança Mitty em uma aventura real para resgatá-lo.
Quem é você, Alasca? (John Green)
Calma. Ainda temos um narrador em primeira pessoa, masculino, nerd com alguma peculiaridade aleatória, que tem uma amizade forte com outro garoto e sim, a garota por quem o protagonista é perdidamente apaixonado. Mas há algo tanto na estrutura quanto na forma como o autor aborda certas questões (ei, já chego lá) que faz com que Quem é você, Alasca? seja único e, devo dizer, superior às publicações seguintes. A história começa aparentemente simples: Miles é um garoto meio solitário e meio sem propósito algum na vida que vê em uma ida a um colégio interno a possibilidade de dar uma virada, ou, como ele diz ao citar Rabelais, “sair em busca do grande talvez”. Chegando em Culver Creek, começa uma amizade com Chip (apelidado de “o Coronel”) e cai de amores por Alasca Young, uma garota visivelmente mais experiente, meio doidinha e, nas palavras dele, linda.
Amsterdam (Ian McEwan)
Amsterdam saiu lá fora em 1998, ganhou uma edição brasileira no ano seguinte pela Rocco e ano passado ganhou nova tradução pela Companhia das Letras. Foi o livro com o qual McEwan ganhou o Man Booker Prize, o que eu sei que não quer dizer muita coisa, mas vá lá, agora já falei. Eu acho que o principal de todas as informações sobre o livro é o ano de 1998, tão próximo da virada do milênio e uma fronteira importante sobre a popularização da internet (pouco tempo depois disso, o que era algo para poucos virou lugar-comum em nossas vidas). Isso acaba fazendo um sentido enorme dentro da história de Vernon e Clive, dois amigos que se encontram no funeral da ex-amante e impressionados como o mal que a mulher sofrera fora tão súbito e lhe tirou qualquer dignidade no fim da vida, acabam fazendo um trato de que se um deles acabasse em situação semelhante, o outro deveria dar um jeito de matá-lo.
Como todo livro do McEwan eu comecei lendo achando que seria uma coisa, e aos poucos ele foi se revelando algo completamente diferente do que eu esperava. Eu gosto do jeito que ele quebra essa expectativa, então para mim ver uma história que eu tinha certeza que seria um drama debatendo a eutanásia se transformar em um tipo de suspense salpicado de humor negro foi uma ótima surpresa. Não que não existam debates envolvendo ética, moral ou seja lá qual for o prato do dia: é só que o autor consegue escapar do caminho óbvio que poderia ter tomado.