As melhores leituras de 2015

E láááá vai mais um ano, e láááá vai mais uma lista de melhores leituras. “Anica, por que melhores leituras e não melhores livros?“. Eu sei lá. Sinto que leitura deixa claro que é algo extremamente pessoal, uma lista com critérios totalmente subjetivos (e às vezes malucos) e assim, minha, só minha. Eu posso ler um livro que está todo mundo adorando e também gostar bastante, mas se não rola aquele TCHAN – como aconteceu com o Fates and Furies, por exemplo, o livro fica de fora.

Este ano estou elaborando a lista sem medo de deixar o último livro de 2015 de fora (porque é uma praga, todo ano sempre depois de fechar a lista eu me encanto por um livro, tipo o How to build a girl da Moran no ano passado). O negócio é que comecei a ler A Little Life e considerando o combo 700 páginas + correria de fim de ano, sei que só termino este em janeiro. Então é isso, né.

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Slade House (David Mitchell)

Chega 31 de outubro e chovem listas de livros e filmes assustadores para conhecer. E uma presença constante nas que falavam de livros era a do novo de David Mitchell, Slade House. Saber que era um livro derivado de outro (The Bone Clocks) e que Mitchell tem costurado todos os seus romances criando um universo único poderia ter me desanimado um tanto porque, confesso: nunca tinha lido nada dele. Mas termos como “casa assombrada” piscavam em cada comentário que lia sobre Slade House e caramba, se tem um tipo de história de terror que eu adoro é história de casa assombrada.

Então lá vou eu, né, contando que não saber nada do universo de Mitchell não pese na hora da leitura. E olha, a impressão que tenho é que ao invés de atrapalhar, ajudou, mas falo disso mais para frente. Só que isso nos leva à óbvia conclusão: é um livro bacana de ler sabendo o mínimo possível, a diversão está justamente nas pequenas descobertas que vamos fazendo em cada capítulo. Ou seja: este é um post para quem já leu Slade House.

(Eu adoro esses meus posts sabotadores que afastam os leitores ao invés de trazê-los para cá, haha.

Mentira, não adoro, não. Mas sei lá. Quando é importante não saber eu prefiro avisa para não estragar a experiência de quem planeja ler o livro. Dizer que gostei muito já ajuda? Espero que sim.)

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A Head Full of Ghosts (Paul Tremblay)

Não sou exatamente fã de listas intermináveis de atributos físicos de personagens (o famoso momento “e ele olhou para o espelho e viu um cara alto, de cabelos escuros, etc”), ambientações ou qualquer outra coisa que envolva descrições em livros. Confesso que meu cérebro costuma ignorar as informações passadas pelo autor, e aí eu meio que imagino as personagens como pessoas completamente diferentes do que é descrito no texto – por isso eu quase sempre sou a última no bonde da revolta na hora da comparação entre livro e adaptação para o cinema.

De qualquer forma, mesmo sendo rebelde e deixando de lado as orientações do autor, tem um tipo de livro que respeito e sigo direitinho até o fim: as histórias de terror. O terror depende muito disso, de você conseguir se transportar para o momento narrado, como se estivesse com outras personagens. Porque veja bem: terror (bom) vem armado de sutilezas, de pequenas sugestões, ideias plantadas em parágrafos que parecem cheios de irrelevâncias que vão crescendo em sua mente conforme a leitura avança. E Paul Tremblay me conquistou justamente por esse horror sutil em seu A Head Full of Ghosts. Assim, de desligar o kindle e ficar com medo de dormir com a luz apagada à noite.

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Operação Impensável (Vanessa Barbara)

Acho que toda pessoa que sai de uma roubada em termos de relacionamentos amorosos eventualmente chega no momento em que junta várias pistas do que parecia mostrar de forma óbvia que aquilo era uma cilada, e então se pergunta: ONDE DIABOS EU ESTAVA COM A CABEÇA? Um questionamento injusto, convenhamos. Quando tá tudo bom, quando os hormônios ainda estão lá despirocando nossa cabeça, nosso julgamento fica completamente prejudicado. Uma coisa é ver o relacionamento depois que já acabou, outra completamente diferente é enxergá-lo enquanto ele está vivo. E tem mais: alguns eventos parecem completamente banais até o momento do rompimento, quando só aí notamos que na realidade os motivos já estavam se empilhando há tempos.

O bom de saber o futuro é que podemos selecionar, reinterpretar e editar o passado à luz do que sabemos que veio a ocorrer.

E não só é algo bastante comum em nossas vidas, mas a Literatura também está cheia de histórias sobre rompimentos e esse momento do ONDE DIABOS EU ESTAVA COM A CABEÇA?. O que parece que poucos até hoje conseguiram perceber é que muitas vezes não é só uma questão de hormônios exaltados ou fatos escondidos que nos levam ao que seria uma cegueira temporária. O lance é que bem, a resposta às vezes é simples. Nossa cabeça estava num bom lugar, porque estávamos felizes e as coisas iam bem.

E digo tudo isso porque provavelmente o que mais gostei em Operação Impensável de Vanessa Barbara1 foi o trabalho da autora em mostrar esse momento de paz. Aliás, não estou usando por acaso o termo aqui – como a narradora Lia é uma historiadora especialista em Guerra Fria, as quatro partes do livro são divididas exatamente como fases do conflito: Período de paz, Early War, Mid-War e Late War (já volto a falar da divisão). Continue lendo “Operação Impensável (Vanessa Barbara)”


  1. A primeira edição pela Biblioteca Pública do Paraná era bem chatonildo de achar por aí, agora benzadeus, está saindo pela Intrínseca e super acessível 

The Story of the Lost Child (Elena Ferrante)

Vou deixar um aviso inicial para quem chegou no post mas não faz ideia do que se trata: Oi, amiguinho. Este post é sobre o quarto e último livro da série napolitana escrita por Elena Ferrante. Se você quer saber mais sobre o assunto, sugiro começar pelo post que fiz sobre o primeiro livro, A Amiga Genial. Depois tem um sobre o segundo livro (The Story of a New Name) e o terceiro (Those Who Leave and Those Who Stay). No momento só o primeiro livro tem tradução no Brasil, saiu pela Biblioteca Azul da Globo Livros. Tudo explicadinho? Ok, então lá vou eu.

***

The Story of the Lost Child tem como ponto de partida o final do terceiro livro: Lenu abandonando tudo para passar alguns dias em Montpellier com Nino. De novo Elena Ferrante cozinha a história em fogo brando, com Lenu descrevendo seus dias com o amante e o início da separação. Terminado o livro eu ainda queria muito, MUITO, MUUUUUUITO que o final de Those Who Leave and Those Who Stay ainda fosse aquela fala da Lenu para Nino: “I said my way, not yours. Between you and me is over.” porque não é querer ficar julgando a vida de personagens fictícios, mas caramba, decisão ruim atrás de decisão ruim da dona Lenu, sabe. Foi puxado, foi sofrido.

Porque mesmo quando Nino diz umas coisas bonitas lá no terceiro volume, você sabe, não dá, ele não presta. São várias bandeirinhas com um ALERTA! escrito em vermelho que vão aparecendo, pequenos detalhes narrados por Lenu que te fazem perceber que o sujeito é um grandíssimo filho da puta. Nem tanto por ser mulherengo – isso é irritante, e em determinado momento no livro chega até a ser chocante – mas são as ações dele. Todo aquele discurso que parece empoderar mulheres e de repente está ele lá, anulando completamente Lenu na França, só dando alguma atenção para a mulher quando outras pessoas descobrem (porque ELA falou) algo sobre os livros que tinha publicado. Ou quando morre de ciúmes sobre Pietro mesmo não tendo a coragem que Lenu teve e continuar mantendo o casamento com Eleonora. Continue lendo “The Story of the Lost Child (Elena Ferrante)”

Autobiography (Morrissey)

A autobiografia do Morrissey saiu lá fora já tem quase dois anos. Os direitos de publicação aqui no Brasil são da Globo Livros, que prometia a tradução para abril do ano passado mãããs, numa pesquisa rápida no site da editora eu não encontrei nada. Não sei o que pode ter acontecido, talvez o problema envolvendo a venda dos direitos pela Penguin (que, surpresa, surpresa, deixaram o Moz descontente). De qualquer forma: quase dois anos, e eu ainda não tinha lido. Logo eu.

Sendo bem sincera, a verdade é que aquele primeiro parágrafo gigante me enchia de preguiça, o que vencia qualquer curiosidade sobre o que Moz tinha a dizer sobre a própria vida (já comentei por aqui, não sou do tipo que se sente confortável esmiuçando a vida pessoal de artistas). Não sei se vou conseguir explicar, mas é mais ou menos assim: por exemplo, o A Arte de Pedir da Amanda Palmer é bem bacana, e eu admiro horrores a Amanda (às vezes acho que até mais do que o trabalho dela). Mas me incomodou profundamente o tom de justificativa para hater que o livro acabou tomando. Não estou dizendo que com isso o livro ficou ruim, mas aquela pontinha da justificativa desnecessária está sempre lá, cutucando.

E eu achei que o Morrissey seguiria por esse caminho, uma espécie de carta de justificativa, um mero “dar a última palavra” sobre assuntos do passado. Porque mesmo que você não dê a menor bola sobre a vida do Morrissey, é impossível não ficar a par das inúmeras polêmicas em que ele acabou se envolvendo durante sua carreira. São muitas. O cara é um pára-raio de treta. Mas então lá vamos nós, começando na infância do músico…

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My Fat, Mad Teenage Diary (Rae Earl)

Quando era adolescente lembro que tinha um gosto especial por livros que seguiam o formato de diário. Passava horas acompanhando os dias de personagens como Susie e seu irmão hipocondríaco. Como toda adolescente leitora de Capricho da época, embarquei nos dias de Zlata (assar pão em uma panela :~~ ) e por aí vai. Foi meio o que me motivou a escrever diariamente sobre minha vida, por mais que pouco tivesse para contar de verdade (nunca precisei assar pão em panela, por exemplo). E a realidade é que tinha até esquecido como o formato me agradava até começar a ler My Fat, Mad Teenage Diary, de Rae Earl, livro que originou a série mais bacana que assisti este ano.

O legal de livros baseados em diários é que eles acabam mostrando bem a vida como ela é. Aquele sujeito para quem você não dava a menor bola de repente vira seu melhor amigo em pouco tempo. Algo que ocupava sua mente de forma obsessiva vai sendo deixado de lado. Um ano às vezes pode ser pouco tempo, mas para a vida de um adolescente é tempo suficiente para refletir dezenas de transformações, mesmo que às vezes o leitor fique sem um desfecho propriamente dito (o dia 31 de dezembro pode não trazer todas as respostas, mas convenhamos, poucos dias 31 de dezembro trazem para todos nós).

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The Versions of Us (Laura Barnett)

Tem uma cena que gosto bastante em Quase Famosos, se eu não me engano o empresário da banda estendia as mãos para o grupo. Uma estava fechada, na outra ele mostrava um isqueiro. E então ele dizia “You can have only one. Which one do you want? As long as you can’t see what is in this hand, you’ll always want it more.” e ele abre a mão e mostra que estava vazia. O que gosto dessa cena é que ela mostra um problema constante em nossas vidas: não temos como saber como seria se tomássemos uma decisão diferente, então quando as coisas vão mal por causa de uma escolha, tendemos a romantizar as outras possibilidades, enxergá-las como possivelmente as corretas, as que nos fariam felizes.

É esse exame das possibilidades que Laura Barnett traz em seu primeiro romance, The Versions of Us. Aqueles momentos que uma vez ou outra vemos em nossas vidas como decisivos, e tentamos adivinhar como seria “se…” eles não tivessem ocorrido, ou ao menos ocorressem de maneira diferente. Seguindo três versões das personagens Eva e Jim, que se conhecem em 1958, quando têm 19 anos.

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História de quem foge e de que fica (Elena Ferrante)

ATUALIZADO 28/10/2016: Aeeee chegooooou tradução pela Biblioteca Azul, o título ficou “História de quem foge e de quem fica” e a capa é essa coisa linda aqui à esquerda. Como ainda não reli o livro não deixarei comentários extras e as citações continuam em inglês, mas uma vez que esse é meu favorito da tetralogia, logo releio e atualizo aqui.

Então. Eu tinha um plano, ficar enrolandinho com minhas leituras mais ou menos até a última semana de agosto, quando então leria o terceiro livro da série napolitana, Those Who Leave and Those Who Stay. Aquela coisa: Elena Ferrante já tinha armado nos dois livros anteriores desfechos de deixar o leitor louco para partir para o próximo volume, assim eu já esperava por algo do tipo no terceiro – com a diferença que nesse caso seria obrigada a esperar até setembro quando só então poderia ler o quarto livro. Era um bom plano, mas não deu. Caí em tentação, fui “dar só uma olhadinha” e quando percebi já foram lá 50 páginas e bem, continuei.

Isso tudo é para você que ainda não leu a Elena Ferrante entender que não é só a história em si, é como ela conta. É um daqueles casos de escritas meio viciantes, e você até saca as estratégias da autora para prender sua atenção, mas ok, você caiu como um patinho e está lá “só mais um capítulo e eu vou dormir/almoçar/fazer qualquer coisa que seres humanos não viciados em um determinado livro fazem”. E também para dizer que o post conterá spoilers e que se você quiser saber mais sobre os outros dois volumes, é só clicar aqui e aqui (eles também têm spoilers hahaha).

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A Garota no Trem (Paula Hawkins)

Eu detesto aqueles blurbs em livros que dizem “O novo (insira aqui algum título de sucesso)”, confesso que crio uma antipatia boba automática e aí e enrolo um monte para ler o livro (ou em alguns casos, nem leio). Mas quando comparam A Garota no Trem de Paula Hawkins com Garota Exemplar, tenho que dizer que eu meio que consigo entender o motivo.

Sim, tem lá o óbvio: o sumiço de uma mulher e a culpa caindo sobre o marido. Ok, já vimos isso em vários outros lugares, não é exatamente novidade – já não era quando Garota Exemplar chegou nas livrarias. A questão é que, como sempre, não é bem o que se conta, mas como se conta. E assim como o motor principal de Garota Exemplar era mostrar que não conhecemos realmente ninguém e nos apressamos em julgamentos a partir das pequenas porções das histórias sobre essas pessoas, A Garota no Trem parece trazer uma ideia semelhante, embora executada de maneira um pouco diferente – daí as comparações.

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