Quase final de janeiro, Globo de Ouro já passou, amanhã saem os indicados do Oscar e eu nem tchuns para minha lista dos melhores de 2018. Vá lá, a verdade é que vi pouca coisa no ano que passou. Um misto de preguiça e muita coisa para ler para as aulas (e o número absurdo de série nova que tem saído, tá loco). De qualquer forma, só para não ficar sem o registro, vou deixar minha listinha.
Aquela coisa de sempre, vale lançamentos no Brasil, com a chunchadinha básica do “lançamentos em festivais”. Sinais do tempo, coisa que nunca explicitei mas acho que vale a pena deixar claro: valem filmes lançados direto no catálogo nacional de serviços de streaming como a Netflix.
1. O Conto (The Tale, 2018): Com roteiro e direção de Jennifer Fox, e baseado em experiências pessoais da artista, o filme é maravilhoso e com certeza meu favorito do ano passado. É difícil por causa do tema abordado (o abuso de menores), mas o ponto forte é justamente o modo como o faz. A personagem interpretada por Laura Dern começa o filme sem saber que foi abusada. Ela teve uma relação com pessoas mais velhas, mas não encarava como abuso – a memória inclusive era de grande carinho e admiração por essas pessoas. E acredito que o momento principal do filme é quando Jennifer pega uma foto da adolescência, acha que é do período em que teve o relacionamento e então a mãe a corrige e mostra outra foto: era uma criança. 11 anos.
2. Aniquilação (Annihilation, 2018): Li o livro do Jeff VanderMeer em 2015 e adorei. E aí sai a notícia que o Alex Garland do Ex-Machina faria a adaptação e vem os sentimentos conflitantes. Porque iei, está em boas mãos mas bem, o que supera a nossa própria imaginação, não é mesmo? E acaba que me surpreendi positivamente porque como filme Aniquilação é diferente. É uma outra experiência, por mais que o DNA do livro esteja lá (e comparação é até irônica se for pensar no enredo). E aí entra a parte visual, que funciona perfeitamente tanto quando é para maravilhar (a cena da Josie entrando na floresta com folhinhas brotando no braço é inesquecível) quando para criar a atmosfera de horror. Foi realmente além das minhas expectativas.
3. Tully (Tully, 2018): Para explicar Tully, uma história pessoal: amei o filme e uns dias depois fui contar para minha mãe. Contei por cima o enredo, aquela coisa, a mãe com dois filhos e mais um recém-nascido, acaba topando contratar uma babá noturna, a Tully, para que cuide do bebê enquanto ela dorme. Quando fui descrever um determinado momento para minha mãe, ela nem precisou de muito para entender: o conflito que toda mulher passa quando chega a maternidade, a mudança que mesmo quando planejada é algo tão grande que parece que da noite para o dia viramos outra pessoa. E é isso, Tully aborda a maternidade sem lentes cor-de-rosa, mostrando aquilo que é. E além disso, toca em um ponto fundamental da experiência de ter filhos, o papel do pai nisso tudo, mostrando principalmente como é fácil/natural/automático atribuir tudo à mulher, e achar que ações pontuais valem “pontos de paternidade”. Enfim, bom demais. Vou nem falar da Charlize porque nessa altura do campeonato ela já é hors concours.
4. No Coração da Escuridão (First Reformed, 2017): Mas que droga de título em Português, eu olho minha lista e penso “mas ué que filme é esse?” aí vejo o nome original e “ahhh, claro”. Primeira coisa para dizer é que Ethan Hawke teve um ano muito bom. Está ótimo em Juliet, Nua e Crua e maravilhoso neste filme (meu teste de atuação para o Hawke é “o quanto ele me faz esquecer do Jesse” e aqui foi nota 10). Segunda coisa é o roteiro do Paul Schrader, espetacular não só pelo desfecho ambíguo, mas porque reflete tão perfeitamente a agonia dos nossos tempos. Uma mulher grávida pede para que seu marido (um ativista ambiental) se aconselhe com um reverendo para desistir do suicídio, o conflito no final das contas vai além da religião (“Deus pode nos perdoar pelo que fizemos com esse mundo?“), chegando no ponto em que nós, que sabemos o quão fodido o mundo está, e nos sentimos tão impotentes, como podemos continuar, seguir em frente. “A coragem é a solução para o desespero, a razão não fornece respostas. Eu não posso saber o que o futuro trará, nós temos que escolher apesar da incerteza. A sabedoria está sustentando duas verdades contraditórias em nossa mente, simultaneamente, esperança e desespero. Uma vida sem desespero é uma vida sem esperança. Sustentar essas duas ideias em nossas mentes é a vida por si só.“
5. Hereditário (Hereditary, 2018): Ambientação em terror é tudo. Você criar uma história em que não precisa ficar mostrando fantasmas ou monstros para deixar quem está assistindo tenso. Desenvolver a atmosfera de tal forma que você saiba desde o princípio que tem algo muito errado ali, mesmo que as regras do jogo ainda não estejam claras. Hereditário é perfeito por isso. Vai nos conduzindo nesse clima completamente bizarro da família de Annie, e inclusive chega a brincar com alguns tropos já conhecidos do cinema de horror (e aí nos surpreende de um jeito que mesmo eu, que vi o filme meses depois de ter saído de cartaz e honestamente não dou a mínima para spoilers, mandei um sonoro WTF em uma cena). Filmão dos bons, mantendo a média de pelo menos um filme de terror que já nasce clássico desta década de 2010 (aliás, já que estamos em 19, talvez seja um bom momento para fazer uma lista com esses filmes).
6. Pantera Negra (Black Panther, 2018): Tem toda a parte do visual (eu tenho vontade de rever daqui uns anos e ver se Wakanda envelhecerá tão bem quanto a Terra-média), mas o que mais me encantou em Pantera Negra foram as personagens. Temos aí uns trocentos anos de “filmes de herói”, e alguns são ótimos, mas você pega as personagens secundárias ou antagonistas e você conta nos dedos as que se destacam. Acho que antes do Killmonger, só consigo pensar no Loki. Mas em Pantera Negra, para deixar claro que o problema não é só o antagonismo na Marvel, você tem lá a Shuri, a Okoye, etc. e fica torcendo para uma continuação porque quer ver mais delas, não só o protagonista (mais ou menos assim: Jane não aparece em Ragnarok, fez falta? Nenhuma). A parte triste foi reencontrar essas personagens no filme dos Vingadores que achei só ok (minha parte favorita de Guerra Infinita foi um vídeo editado por fã com aquela entrada do Thor ao som de Immigrant Song).
7. Lady Bird: A Hora de Voar (Lady Bird, 2017): Algumas vezes a novidade vem mais do olhar de quem dirige o filme do que da forma como a história é contada. No caso de Lady Bird, você tem lá uma história de crescimento de uma garota, aquela fase de saltar da menina para a mulher, é algo que já foi contado outras ‘n’ vezes no cinema, eu sei. Mas através dos olhos de Greta Gerwig, surgem novas cores para o enredo. Adorei muito a sensibilidade como constrói a relação entre a protagonista e a mãe, o rompimento necessário para crescer. O bacana é que o tom geral do filme é tão bem dosado que ao mesmo tempo que você pode rir na cena em que a filha se joga do carro, mais para frente está em lágrimas quando percebe o quanto a dificuldade do processo de amadurecimento não é só da protagonista, mas também da mãe. Além disso, tem a nostalgia evocada por Lady Bird, um negócio tão bizarro porque o filme é marcadamente pós-11/9, mas a nostalgia não é sobre a primeira década do ano 2000, mas exatamente sobre a fase vivida por Lady Bird. A essência do crescimento está tão bem capturada que a história poderia acontecer em qualquer momento, e ainda assim traria essa sensação de nostalgia.
8. Três Estranhos Idênticos (Three Identical Strangers, 2018): Eu não assisto muito documentário, mas quando vejo é sempre um descaralhante da cabeça como este. A história: tá o cara chegando no primeiro dia de aula, todo mundo cumprimentando como se o conhecesse. De repente, pans, ele dá de cara com um doppelgänger. Uou! Gêmeos separados no nascimento! Já é um negócio esquisito, mas aí com o sucesso desse reencontro eles… encontram um terceiro irmão idêntico? E a história fica ainda mais doida? Sério, vale muito a pena ver. Aquela frase da verdade ser mais estranha do que a ficção é totalmente real aqui. Olha, eu não sou do tipo fresca com spoilers, mas acho que neste caso o ideal é não saber muito além do que falei aqui, e simplesmente se deixar levar pela corrente de whatfuckness. No Brasil passou no Festival do Rio, mas não vi muitos comentários sobre ele por aqui, pelo menos não tanto quanto na imprensa gringa.
9. A Forma da Água (The Shape of Water, 2017): Eu sou fã do Del Toro, principalmente pelo visual. Tem algo em seus monstros e fantasmas que misturam o sublime e o grotesco e batem certinho com meu gosto. Tanto é que acredito que A Colina Escarlate foi extremamente injustiçado: o filme merecia muito mais reconhecimento. De qualquer forma, fico feliz que Del Toro já tenha chegado em um lugar que fazer um A Colina Escarlate que não faz tanto sucesso e depois ainda poder fazer um A Forma da Água. E então, sobre A Forma da Água: visualmente é lindo, e a história me tocou bastante. A questão de você não ser visto só pelo que te faz diferente. Em tempos como os que vivemos, é até reconfortante ver um filme sobre o outro, e sobre o medo que temos do outro (o gay, o negro, o estrangeiro das subtramas) e ver um aceno para a possibilidade do amor, e não só do ódio para essa situação. Ah, sim. Por causa de A Forma da Água acabei lendo Mrs. Caliban (Rachel Ingalls), um livro da década de 80 que gostei bastantão. Vou deixar a sugestão aí para quem lê em inglês (infelizmente as editoras daqui nem tchuns para o livro).
10. Um Simples Favor (A Simple Favor, 2018): Já nos últimos dias de dezembro, aproveitei as férias para assistir. Quando terminei, a primeira coisa que fiz foi procurar a trilha – aquela versão de Laisse Tomber Les Filles é ótima. O filme é divertidíssimo, é um misto de comédia e thriller – porque sim, há um mistério no centro da história, mas é tudo tão exagerado, tão absurdo que fica engraçado. E dá para sacar que é intencional, principalmente quando a história vai chegando perto do desfecho. Você acha que está assistindo mais uma das trocentas cópias de Gillian Flynn que brotaram por aí e quando percebe é surpreendido, a ideia é justamente zoar essas cópias. Anna Kendrick e Blake Lively estão ótimas, parte do que faz o filme ser tão divertido está justamente nas atuações. Só gostaria que o núcleo dos pais da escola das crianças tivesse uma participação maior, algo meio como o Big Little Lies, mas aí eu já não sei dizer se é uma questão da adaptação ou se no livro essas personagens também ficam meio desconectadas da história. Edit: esqueci de falar do figurino, este artigo aqui dá uma ideia de como é bem pensado.
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2 comentários em “Os melhores filmes de 2018”
Oi, Anica! Como foi de aniversário? Da tua lista só assisti a Aniquilação e Hereditário (pqp aquela cena da cabeça), mas A Forma da Água tá na lista dos que eu quero ver! (Só não assisti ainda porque minha irmã viu ele no cinema e falou mal dele pra mim, aí meio que peguei rancinho.) Adoro A Colina Escarlate!
oiê 🙂 eu sei como é isso do rancinho, peguei do bohemian rapsody depois que li umas críticas e vi uns comentários falando mal, estou achando inclusive q nem vou ver. e tem o bradley cooper que é meu ranço eterno (ou seja, dificilmente eu vou ver a star is born hehehe)
Oi, Anica! Como foi de aniversário? Da tua lista só assisti a Aniquilação e Hereditário (pqp aquela cena da cabeça), mas A Forma da Água tá na lista dos que eu quero ver! (Só não assisti ainda porque minha irmã viu ele no cinema e falou mal dele pra mim, aí meio que peguei rancinho.) Adoro A Colina Escarlate!
oiê 🙂 eu sei como é isso do rancinho, peguei do bohemian rapsody depois que li umas críticas e vi uns comentários falando mal, estou achando inclusive q nem vou ver. e tem o bradley cooper que é meu ranço eterno (ou seja, dificilmente eu vou ver a star is born hehehe)