Sete dias sem fim (Jonathan Tropper)

setediasJá devo ter comentado por aqui de como quando estou sem ideia sobre o que ler uso aquele “users who bought this also bought this” na Amazon1 de livros que gostei para ver se acho outra coisa bacaninha, certo? Bem, um título que aparecia bastante era o This Is Where I Leave You, do Jonathan Tropper. Publicado lá fora em 2009, e chegando no Brasil pela Arqueiro como Sete dias sem fim no ano passado, pela sinopse ele parecia ter um jeitão meio “nickhornbyesco“, digamos assim.  E eu ia lá enrolandinho e deixando para ler outra hora, até que vi o trailer da adaptação que está para sair em setembro deste ano, e sabe aqueles filmes que só pelo elenco você já assistiria? Pois é. Então porque eu não gosto de ler o livro depois de ver o filme, acabei jogando para o começo da fila.

Negócio é: Sete dias sem fim é o equivalente literário de comédia com famílias disfuncionais que vemos no cinema ou na TV. Enquanto o narrador (Judd Foxman) ia descrevendo os irmãos, a relação com os pais e afins, pensei em um punhado de histórias similares. Pega um bocadinho de Six Feet Under, mistura com uma pitadinha de Os excêntricos Tenenbaums, um tantico de Os Simpsons e por que não um punhado de Pequena Miss Sunshine? Mais ou menos assim.  Então sim, você terá aquela sensação de já ter “visto esse filme”, mas veja bem: eu acho que o tanto de histórias já contadas sobre famílias assim só é grande porque se for ver bem, famílias-modelo são a exceção, não o contrário. Então é um tema tão comum que talvez a familiaridade que você venha a sentir com algumas personagens seja grande não por causa de filmes, mas por causa de pessoas reais que você conheça (lá em casa tínhamos uma piada sobre uma família perfeita que chamávamos de “Os Flanders”, sempre nos referíamos a eles desse jeito. Obviamente nos víamos como “Os Simpsons”).

Enfim, a história começa com Judd descobrindo que após uma longa batalha contra o câncer, seu pai faleceu. Não bastasse isso, nesse momento ele está lidando com o fato de que sua mulher o abandonou por outro homem, homem este que por acaso é seu chefe (o que acaba consequentemente levando Judd a também perder um emprego). Então sim, ele está em um momento péssimo da vida. O negócio é que o último desejo do pai é que a família sente shivá. Para quem (como eu) não conhece muito das tradições do judaísmo, basta saber que a shivá é um período de sete dias em que os parentes de primeiro grau recebem visitas e conversam sobre o falecido, mas não se preocupe que o narrador explica bem o funcionamento desse período de luto. O pedido é recebido com estranheza pelos filhos, já que ele nunca pareceu um homem muito religioso, mas acabam acatando mais por pressão da mãe.

E é aí que vamos conhecendo pouco a pouco cada um dos parentes de Judd. O engraçado é que eles não têm absolutamente nada de extraordinário, são pessoas que você poderia conhecer no seu dia-a-dia, mas (talvez até por isso) são todas extremamente encantadoras. Gostei mais da mãe de Judd e do irmão caçula Philip (uma das primeiras descrições do narrador para a personagem é “He is the Paul McCartney of our family: better-looking than the rest of us, always facing a different direction in pictures, and occasionally rumored to be dead“), mas mesmo as personagens que aparecem menos na história (como Horry, o filho da vizinha) também são interessantes.

Talvez o melhor da escrita de Tropper esteja no ritmo que ele dá para as conversas. Se você tem uma família grande deve saber como funcionam os diálogos, não é uma coisa linear (ou mesmo lógica). E o autor conseguiu passar exatamente isso para o livro, em alguns casos de um jeito que não tem como segurar a risada (como quando Philip começa a cantar uma música aleatória que tem uma palavra mencionada por outra pessoa na conversa). É rápido, é cheio de ótimas tiradas, como quando Judd começa a brigar com o irmão mais velho e então a mãe tenta apartar a briga e um deles diz:

“You always encouraged us to express ourselves in the moment. To let it out.”

E a mãe responde:

“That’s right, honey. I also encouraged you to move your bowels twice a day. That doesn’t mean I want to be there when you do.”

Enfim, serão vários momentos assim, e eu poderia dizer que é só uma comediazinha que me fez rir bastante, mas não é bem o caso. Lembrando, Judd estava em um período bem complicado da vida, e ele é um narrador bem… hummm… introspectivo. O momento em que ele encontra a esposa com o chefe na cama em uma cena de filme provavelmente não duraria nem um minuto, no livro segue por várias e várias páginas – com observações que vão do hilário ao triste em poucos segundos. Em várias outras passagens vemos um tanto de amargura sobre a vida (especialmente quando ele vê pessoas mais novas), misturada com aquela completa falta de perspectiva. E talvez até por se equilibrar tão bem entre o engraçado e o melancólico, o desfecho não segue exatamente aquele padrão “final feliz de comédia hollywoodiana” – aliás, fico até um tanto curiosa sobre como trabalharão com isso na adaptação.

Acho que o único ponto negativo do livro é quando Judd passa do fracassado para, aparentemente, o pinto de ouro da história. Ok, desculpa o termo, não consegui pensar em outra coisa. Não sei, mas foi uma sequência meio exagerada de mulher querendo transar com o cara que até então tinha sido insistentemente apresentado como alguém sem muita sorte com mulher, fica um ar de incoerência. Ou, pior: a sensação de que Judd não era um cara muito bacana, já que só sossega o faixo com a ex quando se dá conta que outras mulheres podem ter algum interesse nele.

Mas ok, aí já é um pouco de implicância minha sobre detalhes do enredo. No geral, Sete dias sem fim é um livro bacana, que conta com a capacidade do leitor de se reconhecer em determinadas situações para desenvolver o humor, o que, convenhamos,  não é lá muito difícil porque (como disse no começo do post) incomum mesmo é ter uma família perfeitinha.


  1. e agora graças ao Stephen Colbert eu jamais clicarei nessas opções sem visualizá-lo fazendo isso aqui 

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