O livro abre com Not a Star, um conto (ou novela, parece um pouco longo mas o fato de eu estar lendo de madrugada e com sono pode ter afetado o meu julgamento) originalmente publicado em 2000. Conta a história de uma mãe que um dia descobre que o filho é ator de filme pornô. Achou ruim? Calma, piora: ela descobre também que o rapaz é extremamente avantajado. É até um conto bacaninha, gostei principalmente das divagações da narradora mais para o final. Vale lembrar também que Lynn é uma narradora feminina até bem razoável, o que acho um ponto positivo, já que o na minha opinião o Hornby não é muito feliz nas histórias com narradoras femininas.
O problema principal do conto é não conseguir achar o tom: se comédia ou se um drama, digamos assim. A parte dos ‘n’ trocadilhos que os pais de Mark faziam sem querer sobre o tamanho do pênis do filho é realmente engraçada, mas a insegurança do marido sobre o tamanho do próprio pênis fica parecendo um pouco desnecessário, sobretudo se lembrarmos que é uma forma curta de texto. A partir daí a parte cômica vai ficando mais rara para chegar a um ponto das já mencionadas divagações de Lynn, que sim, eu gostei, mas que acabam estragando o tom da história: ué, não era para ser engraçado? Quando de repente a coisa toda virou a história de uma mulher que perdeu um filho ainda bebê e que acha que nada de realmente ruim acontece em sua vida?
Mesmo assim, o conto é até ok. Não é o melhor do que eu li do Hornby, mas certamente está beeeem mais para frente de Everyone’s Reading Bastard. Só que aí com a abertura mais morna, quando cheguei no segundo conto já nem estava esperando grandes coisas. Para piorar: narrador era um adolescente que tinha decidido perder a virgindade. Li os primeiros parágrafos, revirei os olhos, acabei achando melhor ir dormir e deixar a leitura para depois. Acabei no dia seguinte, em poucos minutos e, como você provavelmente já deve estar esperando, queimei a língua e adorei.
Otherwise Pandemonium (2005) começa de um jeito que de maneira alguma você consegue pensar que vai se transformar em algo próximo a um episódio de além da imaginação. O narrador-protagonista é um adolescente ali na casa dos 15 anos, que após mudar de cidade está com dificuldades para fazer amigos porque todo mundo fala dos jogos da NBA, e ele nunca pode assisti-los à noite porque tem ensaio com a banda da escola. Resolve assim comprar um video cassete, para gravar os jogos e assistir quando voltasse dos ensaios, o negócio é que logo na primeira noite ele descobre que seu video cassete consegue avançar o que é transmitido na tv. Ele vê o jornal da manhã seguinte, vê episódios de Friends e de Buffy que ainda nem foram ao ar e também vê os jogos da NBA, é claro.
E se aqui você esperava qualquer coisa sobre ele usar essas informações para ser um garoto popular na escola, vem aqui a parte que me conquistou completamente (até porque nunca, nunca esperei que Hornby fosse para esses lados um dia). Hum, spoiler, pula lá para o próximo parágrafo. Então, ele fica completamente obcecado, passa todo seu tempo livre avançando a programação da tv. Até que percebe que há algo de estranho: vê imagens de telejornais mostrando pessoas fugindo de casa, desesperadas. Sem entender o que acontece, avança até chegar a um comunicado da presidente que é seguido de imagens de pessoas fugindo de Nova York. E então, estática. É o fim do mundo. Óbvio que os eventos mudam a forma de ver até o aspecto mais trivial da vida (comprar roupas para quê?), e é o que levará o garoto até sua primeira vez. Mas acredite, o frio que dá na barriga, até pelo inesperado da situação, faz valer todo o conto.
Mas além disso tem também a voz do narrador, bem bacana para um adolescente, fugindo até daquele problema do Hornby em criar adolescentes maduros demais. Você quase consegue ouvir a voz do garoto, enxergá-lo contando tudo aquilo, até por conta de algumas expressões utilizadas pelo autor ao longo da história. O irônico é que enquanto Hornby erra a mão ao não saber dosar o cômico do dramático no primeiro conto, aqui ele também mistura os tons, mas consegue dar conta muito bem disso – não fica a sensação de estar lendo duas histórias em uma, é tudo uma coisa só, bem alinhavada, mesmo que o modo de contar do menino seja completamente caótico.
Foi uma surpresa tão boa que chego até a ficar triste por Hornby não ter tentado mais nada dentro da ficção especulativa, acho que ele escreveria muita coisa legal nesse campo. E bem, mesmo que curto o livro acabou servindo para abrandar um pouco a abstinência. Ainda bem, até porque pelo que eu andei especulando, livro novo dele só em 2014.
Em tempo: em 2005 a Penguin lançou o livro com o mesmo conteúdo, só que sob o título Otherwise Pandemonium em uma coleção de pockets para celebrar os 70 anos da casa. A capa é esta aqui, mas como dá para notar pelo link, pelo menos na Amazon americana ele está esgotado.