E digo isso porque o livro por si só não explica o fato de ele estar entre os mais vendidos. É uma ótima ideia, porém muito, muito mal executada. O começo ainda passa alguma impressão de que será uma leitura que valerá a pena – Hadley, a narradora, avisa de antemão que não trata-se de um livro de mistério, construído de modo a descobrir quem será a segunda esposa de Hemingway (Pauline, uma amiga de Hadley que conhece o escritor em Paris). A franqueza da narradora conquista o leitor, o problema é que a atenção logo é perdida com devaneios completamente desnecessários para a narrativa.Se a intenção de McLain era uma abordagem mais psicológica de figuras históricas como o próprio Hemingway, ou ainda os Fitzgerald, Ezra Pound, Gertrud Stein e outros, o problema é que ela é romântica e melosa demais. McLain cria uma Hadley que claramente se vê como uma santa que suporta todas as dificuldades que o casamento com Hemingway lhe impõe, em nome do amor que tem por ele. Inicialmente é até compreensível, mas a verdade é que essa fórmula começa a se repetir de tal maneira que fica simplesmente enfadonho – o que é um absurdo se imaginar que a história se passa na Paris da década de 20.
Além disso, o recorte do tempo conta de forma desfavorável para a história de McLain, porque boa parte do tempo da narrativa é o mesmo de Paris é uma festa, de Hemingway. Se o leitor já teve as memórias do escritor em mãos, sabe como ela é deliciosamente escrita, e aí a comparação com os eventos que ambos descrevem é inevitável, e é evidente que McLain sai perdendo nesse placar.
É claro, não é um tempo jogado fora. Há alguns momentos no livro que são realmente interessantes e vale a pena imaginar de fato o ponto de vista de Hadley para determinados acontecimentos, como por exemplo quando ela perde manuscritos de toda a juventude de Hemingway (o evento aparece n’O Livro dos Livros Perdidos) ou o fato de que se não fosse pelo interesse dela em ler O grande Gatsby, o marido provavelmente jamais o teria lido nem começado uma amizade com Fitzgerald.
De qualquer modo, permanece a sensação de uma ideia muito boa, mas que foi mal desenvolvida. O excesso de melodrama torna a leitura cansativa, daquelas que quando você lembra que o livro te espera na cabeceira da cama a sensação da lembrança não é boa, mas ruim, como se fosse uma questão de honra terminá-lo. Se o leitor saiu do cinema após ver Meia Noite em Paris e deseja mais daquela cidade naqueles tempos, continuo achando que a melhor leitura é sem sombra de dúvidas Paris é uma festa do próprio Hemingway.