O livro traz sete contos de Herman Melville, (muito bem) traduzidos por Lúcia Helena de Seixas Brito. São como pequenos recortes da vida do século XIX, e talvez por isso mesmo acabará agradando bastante aqueles que tem gosto pela literatura da época. Mas o que se destaca nesses contos é como a leitura que se faz deles pode ser tão atual mesmo nos dias de hoje.
A palavra de ordem é alegoria, o dizer o outro. Em um retrato que em uma primeira leitura possa soar como simplesmente do cotidiano, acaba vindo carregado de outras leituras possíveis, de muitos outros significados. Acredito que o melhor exemplo disso seja o conto O homem dos para-raios, que descreve o encontro entre o vendedor de para-raios e um sujeito em uma noite de tempestade. A ideia no desfecho do texto, denunciando aquele que vende medo enquadra-se tão bem em tanto do que se vê hoje em dia, na polícia (medo do terrorismo), na saúde (medo de envelhecer), no social (medo de ficar só). Quanta coisa não compramos porque sentimos medo, sem sequer percebê-lo? Ideia genial, trabalhada muito bem por Melville.
O violinista (que abre a coletânea) tem um tom bastante familiar. No prefácio Caetano W. Galindo traça uma comparação com Machado de Assis, e acredito que ele esteja certo sobre isso. É quase como se o leitor já conhecesse o estilo de Melville, mas na realidade o reconhecimento vem da lembrança do modo de escrever de outro autor. A familiaridade imediata com a prosa do escritor norte-americano acaba fazendo com que a leitura flua ainda melhor.
Como pequenos retratos da vida no século XIX, mesclado às vezes com o fantástico, às vezes com uma ironia sutil, o narrador se apresenta a todo momento com tom de conversa, de quem conta um “causo”, o que faz histórias como O paraíso dos solteirões e O inferno das donzelas (que se completam) tão boas. Definitivamente, vale a pena conhecer esse lado de Melville presente na coletânea O violinista e outras histórias, especialmente para aqueles que já o conheceram como romancista.