Veja só o caso de George Orwell. Tomando apenas os trabalhos mais conhecidos, como 1984 e Revolução dos Bichos, é indiscutível a importância desse escritor para a literatura do século XX. E se ao bater os olhos nas fotos de Eric Arthur Blair (nome de batismo do autor) você pensa que era só um tiozinho que escrevia umas boas histórias entre uma xícara de chá e outra, temos A vitória de Orwell (de Christopher Hitchens) para mostrar o contrário.Com tradução lançada no mês passado pela Companhia das Letras, é importante frisar que não se trata de uma biografia de Orwell, pelo menos não se considerarmos a ideia formal que se tem desse tipo de livro. O que Hitchens faz é dissecar vida e obra de Orwell nos mínimos detalhes para mostrar que o inglês era uma figura complexa o suficiente para estar além de qualquer rótulo que possam querer usar para falar sobre ele. E a questão é que Hitchens em muito já toma que o leitor interessado em conhecer um ponto de vista mais aprofundado sobre, por exemplo, posicionamento político de Orwell, provavelmente já sabe um pouco mais sobre a vida do escritor.
A fase que Orwell passa na miséria, por exemplo, é comentada no capítulo sobre Orwell e a Esquerda quase que apenas passando a referência sobre em qual obra encontrar mais informações sobre esse período (no caso, Na pior em Paris e Londres). Não espere relatos detalhados de momentos como esse, porque a preocupação de Hitchens é sobretudo destruir certas imagens criadas e perpetuadas que não fazem justiça alguma a Orwell. E quando uso o termo “destruir”, é porque ele não tem muitas papas na língua ao contra-argumentar, chegando a citar nomes e trechos do que certas pessoas já falaram sobre o escritor para então expor sua opinião (algumas vezes até bem ácida) sobre o que citou.
Por causa dessa “briga” comprada por Hitchens, talvez os melhores capítulos sejam justamente os sobre posicionamento político de Orwell (direita e esquerda). Aliás, o terceiro capítulo (Orwell e a direita) traz uma ótima passagem com opiniões do autor sobre a Guerra Fria, trazendo inclusive uma informação que eu desconhecia: que o termo tão utilizado por todos foi inventado pelo escritor.
E apesar de não ser uma biografia propriamente dita, é impressionante como mesmo menções breves à vida de Orwell mostram tanto sobre ele. Desde os tempos na Birmânia, a amizade (e separação) com o poeta W. H. Auden, a guerra civil espanhola… Tanto do que ele viu acaba deixando claro que uma obra como 1984 permanece atual até os dias de hoje não por acaso. O que Hitchens enfatiza da melhor forma possível sobre a vida que Orwell levou e tudo o que produziu, fica evidente na passagem que conclui o livro:
(…)Mas três coisas ele ilustra, em seu comprometimento com a língua e com a verdade: “opiniões” não contam de fato; o que importa não é o que você pensa, mas como pensa; a política é relativamente desimportante, enquanto princípios, assim como os poucos indivíduos irredutíveis que se mantêm leais a eles, costumam perdurar.
Leitura recomendada para qualquer um que queira ir um pouco além da obra, conhecendo um pouco mais do autor. E principalmente para quem quer ter a certeza de que pelo menos no caso de George Orwell, a personagem de Oscar Wilde em O Retrato de Dorian Gray não poderia estar mais errada no que diz sobre a vida dos grandes escritores.
Odeio seu blog. Praticamente a cada post novo, sinto a necessidade de ler os livros que você resenha. Não tenho tanto dinheiro assim. Muito menos tempo. Gaaah!
é bom saber que estou despertando a curiosidade de leitura de alguns livros em pelo menos alguém. às vezes os posts de literatura ficam sem comentários, e aí sem o retorno eu não sei se o pessoal só lê os sobre filmes e séries +_+
(e dessa agonia de não ter tempo/dinheiro acho que todos nós que gostamos de ler acabamos vivendo, né?)