Pois bem. Eis que após a leitura de Smoke and Mirrors do Neil Gaiman eu me animei a ler novamente Lovecraft (até porque uma das minhas histórias favoritas na coletânea prestava homenagem ao autor). E lá vou eu, conferir uma edição de bolso publicada pela editora Hedra, que me surpreendeu, diga-se de passagem. Fui consultar os livros disponíveis no catálogo da editora e o legal é que eles fogem do óbvio – tem muita coisa que foge dos títulos que vemos nas publicações de mesmo formato aqui no Brasil, a começar pela seleção de contos do Lovecraft. Troféu joinha para eles.
Sobre os contos. Hum. As teorias do Poe ainda pesam muito quando estou lendo um conto de horror. Eu fico pensando naquelas ideias de não ser muito prolixo, para não prejudicar o efeito final e yadda yadda yadda. Nesse sentido, Lovecraft falha miseravelmente MESMO. Porque alguns de seus contos são quase novelas.1 E então eu comecei a observar os textos não como quem tenta atingir a tal unidade de efeito, mas como quem simplesmente quer contar uma história de horror. E aí, meu filho, o sujeito manda muito bem.
O legal nos contos dele não é a unidade de efeito, mas as imagens. Lovecraft é um autor extremamente visual. Mesmo dias após ler alguns contos eu ainda fecho os olhos e vejo o que li como se tivesse presenciado aqueles momentos. E alguns deles são horror puro, ainda mais se somadas à exploração dos demais sentidos que ele faz, ao incluir elementos como frio intenso, fedor insuportável e afins. É um outro tipo de horror, mas é um ótimo horror.
Dos contos presentes na coletânea meu favorito é O Modelo de Pickman, simplesmente genial. Por causa de algumas coisas que o narrador comenta você meio que já sabe o que está por vir, mas essa antecipação acaba auxiliando no desenvolvimento da tensão cada vez que se aproxima da conclusão. E a conclusão por si, é daquelas para não colocar defeito algum.
Gostei também dos demais, mesmo Dagon que já tinha lido antes e não curtido muito, agora ficou interessante depois que adotei esse novo esquema de leitura dos contos do Lovecraft. E no final das contas valeu muito a pena, até (e aqui elogiando a Hedra mais uma vez) pelo trabalho bacana que fizeram, com uma ótima introdução e com uma carta do Lovecraft no fim, além de “Notas sobre a escritura de contos fantásticos”.
Resumindo: daquela história de “Poe ser melhor do que Lovecraft”, eu cheguei a conclusão de que eles são diferentes. E eu sei que isso parece ser o tipo de coisa que se fala sobre a amante para a esposa, mas a verdade é que a coletânea me convenceu que vale muito a pena reler e ir atrás de outras coisas dele.
por novela aqui entenda-se texto mais longo que conto e mais curto que romance, sim? ↩
Eu demorei pra gostar do Lovecraft, na verdade só passei a gostar depois de ter lido no original. Hoje, dentre os meus favoritos, só perde pro Tolkien. E nem por muita coisa não.
Uma coisa que eu adoro nele é a forma como ele descreve o indescritível, que não é falando como é a coisa, mas sim dizendo o que se sente ao ver essa coisa.
Uma coisa que eu achei legal foi a forma como o Stephen King dividiu Lovecraft e Poe. Pra ele, o horror do Poe é mais intenso, mas é mais limitado (talvez a limitação esteja diretamente ligada à intensidade, vai saber?). Por exemplo na Máscara da morte rubra (segundo a tradução duma guria louca aí), temos um infectado invadindo a mansão. É foda, é horrível. Mas, ainda assim, é só um infectado invadindo a mansão.
Já o horror do Lovecraft é mais abstrato, diluído, mas é algo que está além da compreensão, de tão terrível que é. Por exemplo, R’lyeh, a cidade submersa onde o grande Cthulhu espera, dormindo, pelo alinhamento estelar. Tu consegue sentir todo o horror que essa cidade significa, mas não consegue ao certo quantificar esse horror, porque está além da tua compreensão e, por isso, acaba diluindo o efeito “medo”.
Eu gostei das definições =] E acho que a ideia da intensidade estar ligada com a limitação tem a ver. Para dar mais ênfase para o clímax, o Poe não se permite divagar demais, incluir tantos elementos na narrativa. E para Lovecraft, que pende muito mais para o desenvolvimento da atmosfera do conto, quanto mais elementos, melhor.
E no final das contas são horrores diferentes. Cada um pode ser considerado genial no modo como o desenvolve. Lovecraft por criar imagens que ficam na nossa cabeça após a leitura, e Poe por criar horrores que ficam em aberto, para o leitor preencher do (pior) jeito possível.
Quer dizer que o trabalho tradutório é bom? Li muitas críticas à Iluminuras nesse sentido, o que me desestimulou a ir atrás do catálogo lovecraftiano deles, que aparenta ser bem extenso…
Eu não tive reclamações sobre a tradução enquanto lia – e eu pessoalmente acho que deixar o texto do Lovecraft (cheeeeeeeio de adjetivos) algo fluido é bem difícil. Mas quem recomendou essa tradução foi o Gabriel (Tilion) que manja bem dos assuntos (tradução e Lovecraft, hehe).
Realmente a tradução da Iluminuras é bem ruim.
Tanto é que quando li Lovecraft em português, pela tradução deles, não gostei. Só fui gostar mesmo depois de ter lido no original.
A minha Dani tem esse pocket do Cthulhu e realmente está muito bem traduzido.
Cara, desculpe, mas vc definir Lovecraft como “prolixo” foi, digamos… ingênuo e pueril de sua parte.
Ah, sim, porque os contos de Lovecraft são realmente CURTÍSSIMOS, né. Super breves. Aham.
Imagina, realmente muitos de seus trabalhos se estendem bastante, mas talvez a palavra não tenha sido bem empregada ou somente não seja a definição mais adequada para o escritor em questão; pois se levarmos a expressão a termo o que temos é um escritor que não sabe sintetizar seu pensamento de forma explícita, que é enfadonho, supérfluo e cansativo, coisa que- penso eu- Lovecraft não é.
Aí é problema pura e simplesmente da sua interpretação do texto.
pro.li.xo masculino
1. demasiadamente longo, extenso ou demorado
2. enfadonho, fastidioso
3. que usa mais palavras e frases do que o necessário (estilo prolixo; pessoa prolixa)
4. muito longo (discurso prolixo)
Eu usei a última definição. MUITO LONGO.
nuff said.