Havia um anjo perdido entre os homens. Era um anjo que não tinha asas; que chorava, que errava. Também não era perfeito, mas mesmo assim era um anjo. Ele aparecia assim de repente e ia embora sem dizer adeus, mas nunca se esquecia de ninguém.
Havia um demônio que sofria e sangrava sem parar; um demônio que se apaixonava e escrevia cartas, e até fazia algumas pessoas felizes; não tinha rabo nem tridente, mas mesmo assim era um demônio. Um demônio perdido entre os homens.
O anjo e o demônio se apaixonaram um dia. Eles se tocaram… o anjo descobriu o prazer, o demônio descobriu o amor. O anjo mostrou ao demônio o nascer do sol, o demônio mostrou a beleza da noite.
O demônio escreveu várias cartas de amor que o anjo guardou com carinho, apesar de não entender aquelas palavras. O anjo cantou músicas celestiais para o demônio que guardou todas elas em sua memória.
Depois de uns tempos, eles foram separados, mas um sempre esteve no outro. O anjo tornou-se um pouco demônio; o demônio tornou-se um pouco anjo.
O anjo foi expulso do céu, o demônio foi expulso do inferno. Um dia se encontraram numa rua qualquer. Eles se olharam, e depois de um breve tempo se reconheceram: eles eram um homem e uma mulher, ambos perdidos entre os homens.
(Camila Silveira)