Merece? Sim. Budapeste não é nem de longe aqueles livrinhos babas que encontramos semanalmente na lista dos mais vendidos. Não é aquela “literatura-pronta-pra-beber” que ficou tão comum em épocas de Harry Potter e afins. É um trabalho digno do artesão que o Chico de fato é.
A premissa é bem interessante: um ghost writer relatando suas memórias, principalmente depois de que visitou Budapeste. No caso, ghost writer é o sujeito que escreve livros para que outras pessoas sejam reconhecidas pela obra. Através do protagonista, dá para se tirar muita coisa sobre a vaidade humana (bem como lidamos com isso).
A narrativa é essencialmente psicológica e embora o livro seja dividido em capítulos, se tem a sensação de que o protagonista (José Costa) está contando tudo de uma vez só, como se fosse oralmente mesmo. Aqueles devaneios típicos de conversas, lembranças, cortes na narrativa… enfim, tudo lembra a fala de uma pessoa contando para outra sua própria história.
A escolha do narrador em primeira pessoa, assim como esse estilo de narrativa (que lembra muito a Mrs. Dalloway), a profissão do personagem e outros tantos detalhes (até a capa!), foram visivelmente escolhidos para se criar o efeito final da obra. É nisso que relembro a posição de artesão do Chico: ele não contou simplesmente uma história, ele trabalhou essa história. Sinceramente não ficaria surpresa se soubesse que toda a questão das indas e vindas do José Costa a Budapeste não passavam de fundo para esse exercício literário que é a obra.
Em suma, esse livro apresenta tudo o que se espera de um autor ao escrever: a inovação sem medo, o equilíbrio perfeito entre técnica e inspiração e, acima de tudo: esse dom de usar as palavras para emocionar, que o Chico já mostrou tantas vezes que tem.
“E a mulher amada, de quem eu já sorvera o leite, me deu de beber a água com que havia lavado sua blusa.”
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