Estou me divertindo com umas poesias do Gregório de Matos que eu encontrei. Olha só:
Não te posso ver, Anica,
por mais que Amor me desperte,
que tu és muito tirana,
e serás ingrata sempre.
Se foras compadecida,
não cessara de querer-te,
pois a beleza humanada
adquire mil interesses.
Inda assim eu quero, Anica,
que tu me mates mil vezes
com os raios da tua ira
mais do que com te esconderes.
Porque és, Anica, tão bela
que a alma, que por ti se perde,
não pode deixar de ter
muitas glórias aparentes.
Permite por esta vez,
que o teu resplendor contemple,
para ofertar-lhe mil vidas
hoje em holocausto breve.
E se acaso é divindade
a beleza, quem se atreve,
sendo bela, a ser ingrata,
se os atributos desmente?
Havemos de acomodar-nos
na porfia de querer-te,
matem-me embora os teus raios,
porém aparece sempre.
Mate-me a tua isenção,
que eu não cesso de querer-te,
consumam-se os teus rigores
com condição de me veres.